quarta-feira, 10 de julho de 2013

“GRUPO DE ÉVORA” AGORA EM SINES




Centro Cultural Emmerico Nunes
12 Julho - 28 Setembro

Fotografias
António Carrapato, João Cutileiro, Pedro Lobo, José M. Rodrigues + David Infante

Já existiram vários Grupos de Évora, mas neste caso em que se trata de fotografia o grupo não existe, ou melhor, só passou a existir por efeito de uma exposição que se inaugurou em Lisboa, seguiu depois com o nome “4 em Évora” para esta cidade, e está agora em Sines numa nova configuração.

A exposição junta cinco fotógrafos que residem e trabalham em Évora, um deles mais conhecido como escultor, mas que há muito pratica a fotografia. Quatro deles foram  reunidos numa recente exposição d'a Pequena Galeria sob a designação “Grupo de Évora” que assinalou a circunstância de existirem várias obras de grande qualidade que partilham a luz do mesmo lugar, ao mesmo tempo que interrogava essa coincidência, acidental ou talvez não. Entre eles não existiam cumplicidades de trabalho nem qualquer rede de relações comuns, e alguns dos quatro, cinco agora, não se conheciam pessoalmente antes de serem desafiados a associarem os seus trabalhos. Mas sendo a cidade fértil quanto ao surgimento de artistas e iniciativas colectivas (1) importava dar a ver, fotograficamente, esta concentração excepcional, ou única no país, de talentos e de carreiras confirmadas.




Conhecido até agora como fotojornalista, colaborador no Alentejo para diversas publicações, e em especial para o “Público”, António Carrapato (n. 1966, Reguengos de Monsaraz) foi surgindo em várias exposições mais ou menos notadas - por exemplo, a recente mostra dedicada ao "Riso" da Fundação EDP, 2013. Exibe um olhar finamente observador marcado pelo humor, pela atenção ao acaso significativo, pelo gosto do “trompe l’oeil” e do acidente visual, pela aproximação irónica e fraterna ao quotidiano, que é também crítica sem ser exterior à realidade escrutinada - "Nós" foi o título de uma exposição do Museu de Évora, em 2009. Para esta mostra escolheram-se várias das suas imagens já “clássicas”, a cores e a preto e branco, peças de um roteiro alentejano que também já se prolonga por outros itinerários "Europeus".

O escultor João Cutileiro (n. 1937, Lisboa) tem uma obra fotográfica paralela que se expôs pela primeira vez em 1961 e que tem prolongado e renovado até hoje. Os retratos dos amigos, que agora volta a expor com alguns inéditos, numa selecção feita só entre os amigos já desaparecidos, constituem uma muito extensa colecção que teve início nos anos 1950, cresceu durante a permanência em Londres nos anos 60, percorre uma vasta galeria de artistas e intelectuais de referência, e está à espera de ser editada, como documentário, auto-biografia e criação fotográfica maior, num género, o retrato, que raramente é praticado de forma sistemática e tão próxima do quotidiano.  Os nus e as fotografias das suas próprias esculturas são outros domínios paralelos frequentados pelo fotógrafo. Entre a escultura de rostos e corpos e a respectiva fotografia existem trânsitos eloquentes.

Do Brasil veio Pedro Lobo (n. 1954, Rio de Janeiro) para se instalar em Évora, trazendo uma obra já longa e reconhecida. Uma série recente dedicada ao imaginário religioso, em Portugal e no Brasil, a que chamou “In Nomine Fidei”, associada ao seu interesse pelas questões do património, é apresentada através de uma escolha de registos colhidos em velhos templos das Lezírias e do Alentejo, onde a imagem do sagrado se torna ao mesmo mais humana e também mais inquietante graças à presença forte das marcas do tempo e da ruína material. Fotografar a morte das imagens pode ser um modo de pensar o caos do mundo e o fim das ambições de transcendência, ou ainda a sua necessidade. Usando formatos menores que os habituais (lembre-se “Favelas, Arquitectura da Sobrevivência”, com estreia portuguesa em Estremoz, 2009) e expondo agora as fotografias em velhas molduras encontradas, Pedro Lobo constrói novos objectos fotográficos que podem ser também objectos de devoção, sempre diferentes, quase únicos. ( www.lobofoto.com )

José M. Rodrigues (n. 1951, Lisboa; infância em Évora, até 1968), o mais consagrado dos fotógrafos de Évora, para onde veio depois da carreira na Holanda (Prémio Pessoa em 1999), apresenta duas sequências de fotografias recentes e inéditas, num conjunto que é emblemático da sua obra e do modo como ela ultrapassa a dimensão documental para ser uma criação artística radicalmente pessoal, onde o real visto é  simultaneamente exibido e questionado. As molduras folheadas a prata e a ouro tornam mais poderosa uma observação que transcende o reconhecimento para inquirir o  que é o visível, o que é ver e qual a existência das coisas. Não falta um auto-retrato, a presença da água (o Alqueva), um erotismo subtil, a estranheza das coisas e dos lugares surpreendida na realidade quotidiana e a criação de composições objectuais de intenção simbólica. Os olhos animais da série dourada devolvem-nos o nosso olhar.

David Infante (n. 1982, Angôuleme) foi associado ao grupo por razões geográficas - vive e trabalha entre Évora e Lisboa; licenciou-se em Artes Visuais / Multimédia pela Universidade de Évora - mas também é relevante que durante três anos tenha sido assistente de José M. Rodrigues, com o qual o seu trabalho começou por ter notórias e produtivas relações.  Teve um itinerário fulgurante que passou por prémios do Centro Português de Fotografia, em 2006, e do BES/Fundação de Serralves (Revelação 2008), sendo representado pela galeria Módulo, onde expôs “123 90 948”, em 2012, de que se mostram aqui cinco obras: a série toma por título o número de identidade fiscal do artista, o que é um complexo desafio. A identidade e a construção narrativa, o retrato pessoal e ficcionado, a realidade e a ilusão são tópicos que podem conduzir a abordagem destas imagens que não registam acontecimentos nem são  ilustrativas. Existem. ( www.davidinfante.net/ )


    (1)    Recorde-se um Grupo de Évora que associou Joaquim Bravo, Palolo, Álvaro Lapa, Charrua e José Conduto; e outro que juntou João Cutileiro e alguns discípulos, como Pedro Fazenda, Margarida Lagarto, Sílvia Westphalen)


Alexandre Pomar
12 de Julho de 2013  (A Pequena Galeria, Lisboa)
 apomargaleria.blogspot.pt



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