por Sérgio Gomes, do Público (#2, Revista, 8 de Maio,
pág. 36-39)
e http://artephotographica.blogspot.pt
A Pequena Galeria juntou o Grupo d"Évora, fotógrafos que estavam juntos sem o saber
Damos o primeiro passo e, sem aviso prévio, encontramos logo o riso e
a chalaça visual (António Carrapato). Damos outro passo e somos
invadidos pelo cheiro a sacristia, cercam-nos os santos, bamboleiam os
altares a cair de podre (Pedro Lobo). Um passo para a direita e vemo-nos
ao espelho através de um patchwork de retratos pouco vistos no álbum de
família da cultura portuguesa (João Cutileiro). Outro passo mais para a
esquerda e somos armadilhados pelo jogo sedutor das imagens duplas
(José M. Rodrigues). Já no fim, ao quinto passo, voltamos ao início, à
fotografia alegre e divertida (Carrapato) e também aos tons de roxo, ao
odor a cera e... ao Senhor dos Passos (Lobo).
Mas isto é um grupo? É - o Grupo d"Évora que, sem saber, já existia.
Quem os juntou foi Alexandre Pomar para a terceira exposição na Pequena
Galeria, em Lisboa, que pretende tão simplesmente reunir fotógrafos que
gravitam em torno daquela cidade alentejana mas que têm um olhar muito
para lá da geografia. "A ideia foi dar a conhecer um núcleo de
fotógrafos de carreira excepcional que não tinha uma dinâmica de grupo.
Acontece que Évora já teve uma grande dinâmica de grupos de artistas e
por isso achei interessante juntá-los pegando num título que já vem de
trás", explica Pomar.
A mescla de estilos, formatos e famílias fotográficas de Grupo d"Évora
(até 11 de Maio) é grande, diversidade que o comissário transformou num
desafio de montagem nas paredes altas da Pequena Galeria que tem um
espaço expositivo que se percorre em breves cinco passos (mais coisa
menos coisa). Alexandre Pomar vê esta limitação como uma mais-valia, já
que implica mostras com trabalhos de dimensões reduzidas, o que, em
regra, também faz baixar os preços (aqui começam nos 100 euros). Pedro
Lobo costuma expor o seu trabalho em grandes formatos, mas para esta
exposição foi obrigado a repensar as imagens da série In Nomine Fidei,
trabalho sobre a decrepitude de espaços e objectos religiosos que o
levou a procurar molduras antigas que ditaram novos reenquadramentos
(cada trabalho é por isso um objecto único).
Tentando contrariar uma tendência de "usa e deita fora" de muitas
galerias que trabalham na área da fotografia de novos autores, Pomar
sublinha a importância de mostrar o trabalho menos conhecido de nomes já
firmados. Como o de João Cutileiro, dono de um acervo de retratos da
cena cultural portuguesa pouco vistos em público. Cutileiro (que nem
quer ouvir falar em séries numeradas) optou por mostrar impressões a
jacto de tinta feitas na sua impressora caseira. José Manuel Rodrigues,
por seu lado, revela uma série de fotografias inédita (água, paisagem e
auto-retrato), instaladas com papel vegetal por cima, também ele
impresso com imagens da sua autoria. De António Carrapato (colaborador
do PÚBLICO) mostra-se uma faceta autoral rara em Portugal: a do humor,
da fantasia e do divertimento. Porque rir nunca foi tão preciso.
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Da série In Nomine Fidei
© Pedro Lobo |
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Évora, 2010
© António Carrapato |
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Gérard Castello Lopes, 1962, Praia da Salema - Algarve
© João Cutileiro |
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Viana do Alentejo, 2-17-2012, 1h31
© José M. Rodrigues |