segunda-feira, 19 de novembro de 2018

René Bertholo no Hospital do Barreiro


Obras de René Bertholo no Hospital do Barreiro (Centro Hospitalar Barreiro Montijo, EP) a precisar de restauro, instaladas em jardins interiores. Datam de 1983 e sucedem-se a outras criações de arte pública realizadas em França. São em betão armado colorido e resistiram bastante bem ao tempo, ao livre, em pátios fechados junto a zonas de circulação de visitantes.

Esc5_76 1º pátio
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Esc5_764º pátio com peças obras
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Dizia o René numa entrevista que lhe fiz em 1984:

" Tive também vontade de fazer uma pintura que fosse compreendida pelo maior número de pessoas, sem ser popular propriamente. Só me transporto para um campo quase totalmente popular quando faço coisas para a arquitectura. (...)
Quando faço uma coisa para um edifício público, acho que quem vai ver aquilo são pessoas, não direi simples, mas que não têm cultura pictural, e portanto restrinjo-me voluntariamente a um vocabulário mais acessível a toda a gente. Ponho menos elementos que não se sabe o que são, mas ponho sempre alguns.
(...)
Aí, no Hospital, é a "démarche" extrema daquilo que eu procuro. Sei que uma pessoa que não sabe ler não terá um acesso total ao que faço quando pinto um quadro. Mas penso que apesar de tudo vai encontrar uma data de elementos que reconhece, que lhe dizem qualquer coisa, e o facto de encontrar um certo número de coisas que não reconhece, ou não sabe o que é, pode não estorvar uma leitura pessoal do quadro.
Para mim as formas são "containers" (contentores): permitem um certo número de conteúdos, mas não todos. Quando uma pessoa vê um quadro faz forçosamente uma interpretação pessoal que até a pode ajudar às vezes na compreensão de si próprio, e isso parece-me que é o máximo, em todo o caso é o máximo que eu posso pretender,
E um pouco como o 'I King', um livro de adivinhação chinês, anterior à Bíblia, onde se contam histórias que se lêem ao acaso, e cujos elementos têm a função de fazer subir ao consciente o que está no inconsciente. Gostaria que os meus quadros tivessem essa função. "

entrevista publicada a 14-04-1994 no Expresso: "Num quadro há milhões de histórias"

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No hospital existem duas outras obras de "arte pública", de Carlos Calvet (pintura) e Artur Rosa (escultura - autoria a confirmar):

IMG_0095Os vasos defendem uma parte do painel que está um pouco danificado. Julgo que se trata de pintura sobre tela colada em madeira.
O munumento "op", em ferro, está prejudicado pela ferrugem, mas resiste...
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ETHER / EUROPALIA 1991: "Portugal 1890-1990"

"Retrato de grupo"

"Portugal 1890-1990", comissário António Sena
exposições em
Charleroi, Musée de la Photographie: Joshua Benoliel / "Regards Étrangers" (Jorge Calado) / "Les Années de Transitions, 1927-1967" / Helena Almeida
Antwerpen, Provinciaal Museum voor Fotografie, "Regards Inquiets"
publicado em  Expresso Revista, 23 de Novembro de 1991
PODERÁ citar-se a propósito da representação da fotografia na Europália o que se costuma dizer da garrafa meia cheia e meia vazia. Ou seja: o que se levou à Bélgica sob o título «Portugal 1890-1990» foi uma sumária, incompleta e parcial retrospectiva construída sobre apenas alguns momentos significativos da história fotográfica portuguesa; e foi, também, a primeira tentativa global de revisão histórica, o mais amplo panorama desde sempre reunido sobre a história da fotografia em Portugal, e ainda uma belíssima exposição. Não se poderá pretender, contudo, que se tratou de um primeiro passo para fazer aquela história: para lá de algumas outras contribuições episódicas, uma parte central do projecto resulta directamente da acção desenvolvida ao longo da última década pelo comissário António Sena e a associação/galeria Ether, sendo afinal essa mesma actividade que foi agora projectada numa maior dimensão institucional.
Como a falta de memória é uma marca essencial da fotografia em Portugal, importa referir objectivamente os acontecimentos incluídos no programa Europália. Começando por precisar que a representação enviada à Bélgica, embora constituísse uma exposição única, acompanhada por um só catálogo bilingue (francês e holandês), se apresentou dividida entre os dois museus da fotografia do país, um em Charleroi, na região francófona, e outro em Antuérpia, região flamenga.

No primeiro caso, o museu ocupa uma antiga abadia, tendo a nave central, de pequenas dimensões, sido dividida em três espaços atribuídos a mostras individuais de Joshua Benoliel, Sena da Silva e Helena Almeida. Uma outra sala reuniu fotografias de António José Martins, Carlos Calvet, Carlos Afonso Dias, Gérard Castelio Lopes e Jorge Guerra, num itinerário que se desenvolvia entre os anos 30 e os anos 60 através de uma nítida sequência de autores.
Paralelamente, em mais duas salas e um corredor, num percurso labiríntico em torno de um claustro e entrosado com espaços de exposição permanente, apresentaram-se cerca de 70 fotografias feitas em Portugal por fotógrafos estrangeiros, numa selecção de Jorge Calado que incluía exemplares pertencentes à colecção que ele próprio reuniu para a SEC (mostrados parcialmente em Janeiro na Galeria Almada Negreiros), mais alguns da Fundação de Serralves e outros expressamente adquiridos já este ano e para esta exposição graças a uma dotação da Caixa Geral de Depósitos.

Quanto a Antuérpia, o Museu apresentou em duas galerias de mostras temporárias uma selecção de fotógrafos portugueses actuais, incluindo, na primeira, de novo Gerard Castello Lopes e também Paulo Nozolino, José Rodrigues, Rui Fonseca, José Francisco Azevedo e Daniel Blaufuks; e na segunda galeria sequências e «instalações» fotográficas de Mariano Piçarra, Augusto Alves da Silva, António Júlio Duarte, João António Motta, Francisco Rúbio e António Carvalho. Num outro piso, na zona de exposição permanente, apresentou-se Victor Palia e Costa Martins com 10 painéis referentes ao livro de 1959 "Lisboa, Cidade Triste e Alegre" (originais de paginação, colagens com anotações, folhas de contacto, etc.) e mais nove fotografias de recente reimpressão (Lisboa e Tejo e Tudo), ainda como extensão autónoma do panorama relativo aos anos 50.


O CATALOGO, agregando as obras separadas pelos dois lugares de exposição num único discurso, constitui de certo modo um objecto autónomo e no qual é mais compreensível a concepção global do projecto. Embora se trate de um volume de boa qualidade de impressão, ficou ainda longe de corresponder às ambições do comissário, uma vez que o número das reproduções (de página inteira) foi reduzido a menos de metade das provas expostas, algumas reproduções atraiçoaram o carácter de sequência ou instalação dos trabalhos, as legendas ficaram incompletas e os dados técnicos foram drasticamente abreviados por dificuldades editoriais belgas. Neste caso, o confronto com outras edições de A.S. é uma curiosa prova de como, às vezes, se sabe fazer muito melhor em Portugal do que no «estrangeiro».

Seguindo a sequência dos capítulos do catálogo, encontramos primeiro Joshua Benoliel, foto-repórter particularmente activo entre 1903 e 1918, e que pela primeira vez foi objecto de um trabalho sério de selecção e reavaliação; depois o panorama relativo a «Os anos de transição» (1927-1967), onde se incluiu naturalmente Vitor Palia/Costa Martins; o conjunto dos «Estrangeiros olhares» (1930-1989); e, por fim, os «Olhares inquietos» (1980-1991), abrangendo estes tanto o trabalho de Helena Almeida como a mostra colectiva de Antuérpia. Todas as secções são precedidas por textos de António Sena, com excepção da fotografia estrangeira que é prefaciada pelo respectivo coordenador; no final, todos os autores expostos são objecto de exaustivas notas biográficas e bibliográficas. Parte significativa dos textos de A.S. constituem extractos do livro "Uma História de Fotografia" (da colecção «Sínteses da Cultura Portuguesa», editada também por iniciativa da Europália na lN-CM).

As duas exposições e essas duas publicações representam, assim, um todo que provisoriamente constitui o mais ambicioso e completo trabalho de revisão histórica. Na sua totalidade estabelecem-se como uma data decisiva no entendimento da fotografia portuguesa, como primeiro esforço de sedimentação de um «corpus» estabelecido e estudado, ao qual terão de se referir todas as contribuições futuras. Importa agora saber se, depois do momento Europália, surgirão outros estímulos para prosseguir na mesma direcção, ou se, como é usual, a falta de iniciativa institucional (indispensável nesta matéria) abrirá um novo intervalo de esquecimento até uma próxima data. Porque pensar num museu da fotografia em Portugal é ainda ambição irrealista.


É NECESSÁRIO, entretanto, referir algumas condicionantes conhecidas que enquadraram e limitaram o programa expositivo. Em especial, deve saber-se que foram muito reduzidos os meios financeiros disponíveis para esta iniciativa (3710 contos para a produção de Benoliel e 1280 contos para o sector contemporâneo), para além de só muito tardiamente os mesmos terem sido confirmados. De facto, o projecto foi inicialmente pensado como levantamento dos «Grandes momentos da fotografia em Portugal», e devia iniciar-se com a apresentação de dois mestres do documento fotográfico oitocentista, J. A. da Cunha Moraes e Francisco Rocchini. Razões financeiras e o atraso no estabelecimento do contrato de produção fizeram desaparecer essa abordagem ao século XIX (tal como ameaçaram o panorama dos anos de «transição»).
Graças à própria colecção do Museu de Charleroi, no entanto, foi exposta fora do programa oficial e sem referência no catálogo, uma série de 11 «vistas» do álbum de Rocchini sobre o Mosteiro da Batalha, em tiragens sobre papel albuminado de 1870-75. (Assinale-se, a propósito, que Cunha Moraes é actualmente mostrado em Coimbra, em especial através de espécimes cedidos por um coleccionador italiano.)

Quanto a Benoliel, as 34 fotografias expostas resultam de um trabalho de investigação desenvolvido por António Sena na Fototeca da Direcção Geral da Comunicação Social/Palácio Foz, não se tendo trabalhado com os negativos pertencentes aos arquivos da Câmara de Lisboa e outros. Da colecção daquela Fototeca foram inventariados e fichados informaticamente dez mil negativos, sendo realizados 500 diapositivos e 60 provas arquivais, numa colaboração que irá ter continuidade e será publicamente exposta.
Quanto ao sector dos «anos 30/60», ele não pôde ser incluído no protocolo referente à produção da exposição e só foi apresentado graças ao interesse manifestado pelos dois museus e à colaboração dos próprios autores e da galeria Ether, em geral retomando exposições que já apresentara. A não inclusão de Fernando Lemos é uma lacuna particularmente gravosa, mas a recuperação do seu trabalho fotográfico dos anos 50, por iniciativa da Gulbenkian, continua a aguardar-se.

Passando ao sector contemporâneo, importa ressalvar que a ausência de Jorge Molder (referido por A.S., no catálogo, a par de G. Castello Lopes, Helena Almeida, Nozolino e José Rodrigues, como um dos autores que «conheceram, desde 1980, os percursos mais densos e mais regulares») se deve à recusa do próprio fotógrafo - sabe-se que as dificuldades de relacionamento e colaboração entre fotógrafos e entre os agentes da divulgação da fotografia são, infelizmente, uma outra constante decisiva no panorama actual. Entretanto, a inclusão de Helena Almeida partiu de uma proposta de George Vercheval, director do Museu de Charleroi, e foi apoiada pela galeria Valentim de Carvalho.

A mostra intitulada «Olhares inquietos», para a qual o comissário contactou três dezenas de fotógrafos com vista à selecção das obras a incluir, constituiu em parte a actualização de uma colectiva itinerante realizada por António Sena para a SEC em 1989, sob o título «Nível de Olho». Registou-se agora a integração dos «consagrados», que aquela mostra intencionalmente deixara de fora, e repetiu-se, com novas peças, a participação de metade dos fotógrafos então expostos (M. Piçarra, D. Blaufuks, António Carvalho, F. Rúbio e J. António Motta).

Quanto aos «Estrangeiros Olhares», verifica-se a incorporação de 11 autores não incluídos no catálogo "1839-1989 - Um Ano Depois" (ed. SEC. 1990), onde figuravam já 18 fotógrafos com passagem por Portugal, ou por comunidades emigrantes: os novos fotógrafos são Thurston Hopkins (1950), Cartier Bresson (três fotografias de 1955), Peter Fink (duas, anos 50 e 60), Alma Lavenson (1962), Esther Bubley (1965), Godfrey Frankel (1978), Harry Callahan (três, 1982, cor), Larry Clark (1987), Tod Papageorge (duas, 1989, cor), Lynn Bianchi (1989), Dick Arentz (três, 1990). Não referida no catálogo, apesar de exposta em Charleroi, há ainda a apontar uma fantástica fotografia do Terreiro do Paço de 1942, de Cecil Beaton, reeditada a partir da colecção do Imperial War Museum, de Londres. Por outro lado, também cresceram as representações de Neal Slavin (graças à colecção de Serralves), Edouard Boubat (mais 3 fotos dos anos 50), Brett Weston (1960) e Koudelka (1976).

Particularmente significativo é o alargamento do horizonte temporal da colecção até ao presente, com o acolhimento de trabalhos como os de D. Arentz (provas impressas por contacto directo do negativo, com um aparelho de grande formato, sobre desertas paisagens urbanas) e L. Bianchi (recomposição de pormenores arquitectónicos, em estúdio, com modelos geométricos e nus, num trabalho que recorda o de F. Drtikol nos anos 20), e ainda como as fotos a cores de H. Callahan, sobre fachadas de casas tradicionais, ultrapassando-se assim os pólos dominantes dos olhares estrangeiros sobre o exotismo da Nazaré e de uma Lisboa arcaica e misteriosa, nos anos 50-60, ou mais tarde sobre a «revolução dos cravos».

Paralelamente, o Museu de Charleroi acolheu extra-programa um fotógrafo belga, Michel Waldmann, que visitou repetidas vezes Portugal e apresentou algumas calorosas visões jornalísticas, entre outras de efeito mais anedótico.
A recepção interessada das exposições na imprensa de lingua francesa, pelo menos, pode ser registada através de dois títulos significativos: «Photo: un certain regard sinon une forte présence», no «Le Soir», e «Cent ans d'images et de déclics - pour la toute première fois de son histoire, la photographie portugais s'exporte», no «L'Express/Le Vif». A fotografia portuguesa era desconhecida, mas existe - é essa a principal ideia transmitida.


NUMA ordem inversa da da cronologia, acrescentem-se ainda à descrição da iniciativa algumas rápidas anotações criticas sobre os materiais expostos. Na secção contemporânea destacam-se naturalmente os trabalhos de Nozolino e Castello Lopes, e também os de José Rodrigues, fotógrafo com actividade profissional na Holanda que importaria conhecer melhor, sendo todos eles mostrados em breves selecções retrospectivas. Se poderia ser oportuna a sua mais larga representação, não deixa de estabelecer-se uma distinção nítida entre consagrados e novos, uma vez que dos primeiros se expõe uma selecção de trabalhos diferenciados e isoladamente de grande interesse enquanto os restantes mostram um só projecto tematicamente estruturado. Entre estes, confirmam-se abertamente os itinerários recentes de Augusto Alves da Silva e António Júlio Duarte.

A. Alves da Silva apresenta uma sequência de seis imagens alternadas de denúncia de situações de degradação da paisagem algarvia, utilizando uma abordagem friamente distanciada e «neutral» em fotografias de enquadramento frontal sob uma luz constante que privilegia uma gama uniforme de cinzentos; A. Júlio Duarte mostra uma reportagem feita em Macau, com 10 fotos de pequeno formato (P&B), onde a criação de espaços fragmentados e ilusionísticos se prolonga em jogos subtis de máscaras, cartazes e palavras.
Noutro pólo de menor eficácia, no qual a procurada dimensão experimental não parece ultrapassar uma certa inconsequência, o amadorismo ou o exercício privado, encontram-se as contribuições de António Carvalho (Folhas Mortas), trabalho literal e certamente ingénuo de impressão fotográfica, colagem, montagem, coloração de folhas de árvores; de Francisco José Azevedo, «homenagem aos polípticos flamengos e à fotografia de cabeceira» (A.S.); de Daniel Blaufuks, «polaroids» anódinos em caixas com iluminação interior, numa possível referência à publicidade e ao vídeo que constitui mais uma deriva num trabalho que parece multiplicar-se em direcções pouco conciliáveis; e António Motta, com uma instalação dedicada aos «arquétipos técnicos e sensoriais da imagem fotográfica» (A.S.), transportando uma pouca partilhável ambição «poética».

Para lá destas propostas que apenas parecem testemunhar a relação aberta do comissário com a ortodoxia fotográfica, resultam mais interessantes embora carentes de melhor confirmação o trabalho de Mariano Piçarra, as videografias de Francisco Rúbio e a presença do estreante Rui Fonseca com uma série de fotografias da orla marítima de uma discreta dimensão onírica.

É óbvio que se trata aqui de um panorama incompleto (talvez o domínio da foto-reportagem, onde se conhecem alguns trabalhos de segura qualidade, dificilmente pudesse ser apresentado sem um outro contexto integrador), ou de uma selecção afirmativa de interesses próprios do comissário. Mas no terreno das exposições colectivas é perigoso ambicionar consensos e equilíbrios: o que importa é multiplicar as iniciativas, assegurar a independência de comissários competentes e avaliar os efeitos da concorrência entre as suas sucessivas propostas.

A qualidade própria dos trabalhos que representam os anos 30/60 é já conhecida de exposições anteriores. Não se esperará de carreiras ensaiadas à margem de condições mínimas de profissionalização, e quase sempre rapidamente interrompidas, uma produção globalmente competitiva com a dos autores que constituem a história geral da fotografia. Mas todos os fotógrafos incluídos (e também o ausente Fernando Lemos) desenvolveram um trabalho de resistência frente aos valores dominantes no seu tempo e uma incorporação experimental da informação externa, expressos no seu visível interesse simultâneo pela descoberta do país e da fotografia, que se transmite nessas imagens só recentemente recuperadas. Uma outra revisão a fazer deveria agora permitir o confronto directo dessas fotografias, independentemente de uma nítida afirmação de autorias, com uma outra selecção mais ampla feita sobre o foto jornalismo e a fotografia documental do tempo (a arquitectónica e etnográfica, em especial), bem como com o trabalho dos amadores e salonistas seus contemporâneos.
Mas de todo o projecto retrospectivo, é a obra de Benoliel que emerge com definítiva clareza, finalmente liberta das muitas utilizações oportunistas e amadoras de que tem sido presa fácil - e que num primeiro momento justificaram até a rejeição do fotógrafo pelo museu belga. A importância de alguns momentos historicamente decisivos que fixou para «O Século», veio somar-se o encontro com uma efectiva originalidade na prática do fotojornalismo, muitas vezes atenta a um lado mais intimo e inconvencional do testemunho informativo. Veio acrescentar-se a abordagem de um quotidiano da cidade feito de situações «insignificantes», despidas de qualquer retórica ou estratégia anedótica, bem como o interesse por géneros fotográficos menos associados à sua fama mais corrente, como os interiores e as «naturezas mortas». Por outro lado, a exposição ensaiou a indispensável revisão do trabalho de Benoliel em articulação com as condições práticas da divulgação das suas fotografias em «O Século» e na «ilustração Portuguesa», nomeadamente com atenção ao grafismo envolvente, paginação, legendas e textos anexos.
Efectiva redescoberta de Benoliel, como grande fotógrafo e como pioneiro da reportagem moderna dos anos 20, esta exposição mostrou mais uma vez que a autêntica recuperação patrimonial é indissociável do rigor metodológico e técnico, como o trabalho de A.S. tem demonstrado em exposições e catálogos. A retrospectiva nacional e uma edição condigna impoõem-se agora.


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Charleroi: espaços individuais dedicados a
Joshua Benoliel / Sena da Silva / Helena Almeida
+ uma sala com
António José Martins, Carlos Calvet, Carlos Afonso Dias, Gérard Castello Lopes e Jorge Guerra
+
Olhares Estrangeiros (I)

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Antuépia:
Victor Palla e Costa Martins
+
Gérard Castello Lopes / Paulo Nozolino / José M. Rodrigues
Augusto Alves da Silva / António Júlio Duarte /Rui Fonseca / José Francisco Azevedo / Daniel Blaufuks / Mariano Piçarra /  José António Motta / Francisco Rúbio / António Carvalho

Catálogo (bilingue, francês/flamengo)
Introdução, António Sena
Les années de transition (1927-1967), A.S.
Regards étrangers (1930-1989), Jorge Calado
Regards inquiets (1980-1991), A.S.
Bio-biliografias

domingo, 18 de novembro de 2018

ETHER 1. Exposições e edições 1982 - 1998

Exposições na Ether, 1982/83 e 1986/93

Costa Martins / Vítor Palla, Lisboa e Tejo e tudo (1956/59). 1982 (Abril-Maio) Catálogo-cartaz sem data, com notas não assinadas (A.S.). Exp. também apresentada nos 3ºs Encontros de Coimbra, 7-16 Maio 82.
About 70 Photographs. Exp. do British Council. Julho 1982. Sem cat., existe o catálogo britânico. (antes apresentada nos 3ºs Encontros de Coimbra).
Ana Leonor (Madeira Rodrigues), “Abstracção Fotográfica”, pintura, 1982 (6 a 30 Maio). Cat.-cartaz com tx não assinado (A.S.).
Jacques Minassian, Fotografias 1977-1980, 1982 (Nov.) Cat.-cartaz s/d com texto de Gérard Castello Lopes.
Gérard Castello Lopes, Fotografias 1956/1982, 1982 (19 Dez. / Jan. 83). Cat.-cartaz s.d. com texto do autor e outro n. ass. (A.S.)
Johan Cornelissen, Desenhos dos slides imaginários - maio 82/junho 83, 1983. Cat.-cartaz s.d.

António de Oliveira - sacristão, Fotografias 1945/84 [“olhem que isto é para mostrar à família”]. 1986 (31 Out.). Desdobrável s.d.

Comandante António José Martins, Bromóleos e alguns brometos 1922/43. 1986 (Dez./Jan. 87) Cat./cartaz s.d. com texto n. ass. (A.S.) e nota de B. dos Santos Leitão (1931)
Francisco Rúbio, Videografias (1982/83), 1987 (Fev.)  Cat-cartaz s/d. com tx do autor.
(Firmino Marques da Costa, atribuição), "Imagens fugazes" - A viagem presidencial às colónias - 1938/39, 1987 (24 Março - 2 Maio). Cat-cartaz s/d. com tx n. ass. (A.S.)
Sena da Silva, Fotografias 1956/57. 1987 (5 Maio - 20 Jun.). Cat-cartaz s/d.
José Loureiro, "José se quiseres come as sardinhas todas", pintura. 1988 (Outubro). Cat-cartaz s/d.
John Thomson, Street Life in London (1877-78), 1988 (29 nov - 7 jan 89). Cat.-desdobrável s.d. com notas n. ass.
Gérard Castello Lopes, Uma fotografia, 1981, 1989 (Jan.) Cat.-cartaz.
Costa Martins / Vítor Palla, Lisboa e Tejo e tudo (1956- 59), 1989 (2ª versão). Catálogo
Paulo Nozolino Kuan, 1989 (Fev./Mar. ). Catálogo - livro.
Carlos Afonso Dias, Fotografias (1954/69), 1989 (Maio) Cat. com texto de Gerard Castello Lopes.
Carlos Calvet, Fotografias (1956-75), 1989 (Nov.) Cat. com textos de C. Calvet e A. Sena.
José Francisco Azevedo, Revelações (1987/9), 1989, dat. 1990 (Dez./Jan. 90). Cat. com textos do autor e A. Sena.
Daniel Blaufuks, Fotografias (1988/89), 1990. Cat. com texto de A. Sena.
Rui Laginha, "absorver as vibrações dos eléctricos" (1981/5), 1990. Cat. com texto de A. Sena.
Augusto Alves da Silva, Algés-Trafaria, 1990,  1990 (13 Out.) Cat.

Olho por Olho - Uma História de Fotografia em Portugal 1839-1992. 1992, Maio/Julho. Cat. copiografado,  131 exemplares numerados e carimbados (dos quais 50 em edição inglesa). Ver publicações anteriores

Mariano Piçarra, Carneiro, 1993 (Nov./7 Jan). Exp. na Ether e tb. na Mãe d’Água, Lisboa. Acompanhado pela edição de um livro.
Rui Fonseca, Visão Litoral. 1993. Cat. com tx de A. Sena.

Exposições em outros espaços

Nível de Olho - fotografia em Portugal anos 80. Ed. Ether, 1989. (Exp. na Secretaria de Estado da Cultura, Gal. Almada Negreiros, Mar./ Abr., depois itinerante.

Fotoporto / Fundação de Serralves, Porto, 1990. Catálogos
Paulo Nozolino, Paulo Nozolino 1989/1990
Sena da Silva, Sena da Silva - Uma retrospectiva.
Neal Slavin, PORTUGAL 1968.
Christer StrömholmFotografias 1930-1990.

António Júlio Duarte, Oriente Ocidente /East West. Ed. Fundação Oriente, produção Ether (coord. Pedro Gonçalves). Comissariado e texto de Jorge Calado. Exp. Lagar de Azeite, Oeiras 4-28 Maio 1995

José Manuel Rodrigues, O prazer das coisas - uma antologia. 1998.  Ed. Ether, Câmara Municipal de Oeiras, Fund. do Oriente. Coordenação e notas de Jorge Calado. Produção Ether (coord. executiva Pedro Gonçalves). Exp. Palácio dos Anjos, Oeiras (28 Fev.)

Esta lista de exposições e catálogos tem por base a documentação citada no catálogo Olho por Olho e acrescenta duas edições omitidas (Ana Leonor e Jacques Minassian). A lista de exposições prolongou-se até 1993 na Ether e depois em 1995 e 1998 noutros espaços.

sábado, 17 de novembro de 2018

ETHER 2. 1987: Visita Presidencial às Colónias (1938/39)


"Imagens fugazes -  A visita presidencial às colónias 1938/39"
exp. na gal. Ether, 21 de Março - Abril

catálogo-cartaz (subsidiado pela Fundação C. Gulbenkian)

ETHER 3: Uma pequeníssima história de António Sena e algumas objecções

LAPIZ, Ano VIII Número 70 Verano de 1990
Nº especial sobre Portugal, pps 66-71
ANTÓNIO SENA
"Pequeñísima historia de la fotografía en Portugal"

uma cronologia, um ponto da situação, uma história em construção. 
E algumas objecções ou pistas a explorar

Parafraseando o inicio do artigo de António Sena, podemos dizer que somos hoje mais ignorantes sobre a fotografia do que os seus leitores de 1990

"A obra de Benoliel pode entender-se como uma síntese de Atget. Paul Martin e Salomon"

Marques da Costa é também o autor principal do álbum "Exposição-Feira de Angola 1938", editado em Luanda, que ficou por muito tempo desconhecido

ETHER 4. 1992 "Olhos nos olhos" (Olho por Olho)

sobre a exposição Olho por Olho - Uma História de Fotografia em Portugal 1839-1992. 

1992, Maio/Agosto


artigo de JORGE CALADO
publicado no EXPRESSO/Revista de 18 Julho 1992
pps 56-57-58-59

(Publicada a primeira história da fotografia portuguesa, António Sena mostra na Ether a primeira retrospectiva. Retoma-se parte do panorama que foi levado à Europália e assinalam-se os dez anos de actividade de uma associação a quem se deve um trabalho seriíssimo de estudo e divulgação da fotografia)
 Cunha Moraes, "Banana, Margens do Rio Zaire", c. 1878; Costa Martins / Victor Palla, foto de "Lisboa 'Cidade Triste e Alegre'", 1956-59


FOI PRECISO esperar mais de 150 anos para se começar a perceber o que foi, tem sido, é a fotografia em Portugal.  Neste processo de estudo, inventariação, pesquisa e apresentação fomos os últimos. Como escreveu um investigador inglês, «early photography in Portugal is probably the worst documented of any country with the exception of some of the more obscure areas of Africa» (a fotografia antiga em Portugal é provavelmente a pior documentada de qualquer país, à excepção da das regiões mais obscuras da África). Para citar apenas os exemplos mais próximos, pode constatar-se que a fotografia brasileira está bem estudada; a de Espanha nem é bom falar - deixa-nos a perder de vista. 
A fotografia portuguesa é toda a fotografia feita em Portugal mais a produzida por portugueses no estrangeiro. Não há especificidades estéticas que a distingam das suas congéneres europeias ou americanas. Quer queiram quer não, a fotografia é uma arte para «estrangeirados», pois, como bem notou Gérard CastelIo Lopes, os nossos fotógrafos «só se servem de um ingrediente nacional: a água» - tudo o resto é importado. Em Portugal, os fotógrafos corriam atrás do espírito dos tempos e reviam-se nos exemplos que vinham de fora. Como acontecia no resto do panorama artístico, o atraso era de rigor e os modelos seguidos nem sempre os melhores. Mas bem ou mal, o «corpus» fotográfico português é o nosso retrato; o retrato das nossas paisagens e costumes, dos nossos monumentos e das nossas histórias, que a vida é a mesma em qualquer parte do mundo - nasce-se, cresce-se, ama-se e morre-se. A pátria é um acidente geográfico, tal como a família é um acidente biológico. Mas, já que nascemos e/ou vivemos aqui, temos o dever de preservar e estudar a nossa herança cultural, e a fotografia é uma parte integrante desta, talvez a mais importante porque é, simultaneamente, cultura e reflexão e registo das outras culturas. 

ETHER 5. Olho por Olho: fotos de 1850 a 1991

edição original editada em fotocópia com 131 exemplares
20,4 x 14,5 cm
cópia anotada do exemplar 000038, oferta do autor.
128 reproduções
De J. Silveira (nº 1) a Augusto Alves da Silva (nº 128)



ETHER 6. 1992: "Olho por Olho" Parte II


No catálogo da exposição Olho por Olho, Ether 1992, propõe-se uma história da fotografia em Portugal e celebra-se a história da sua última década, isto é, comemoram-se os dez anos da Ether. A bibliografia alarga-se das exposições que tiveram lugar na galeria a diversas outras publicações em que António Sena e a associação intervieram.

ETHER 7. 1992 Olho por Olho (Parte I)



ETHER 8. A colecção escondida de António Sena

(30/12/2013)
Há meses, na inauguração da exposição das fotografias (mal) atribuídas a Sena da Silva, na Cordoria Nacional, um amigo trouxe-me uma informação surpreendente: a colecção de fotografias (e certamente também de livros e revistas) de António Sena (o autor da única história da fotografia - ou da imagem fotográfica - em Portugal, Porto Editora 1998) iria ser instalada em Cáceres. Não havia pormenores sobre o local ou a instituição que a acolheria, por doação, depósito ou venda. Ficaria certamente acessível, e melhor tratada na Estremadura espanhola que em qualquer instituição portuguesa. Era uma boa notícia.

Hoje, outro amigo tinha outra notícia, que transmitiu com idêntica convicção e falta de pormenores. Agora, a colecção (em vez de destinada a Cáceres) iria para uma ilha do Pacífico, que depois precisou que seria próxima de Timor, um ilhéu deserto. Não parecia sensível ao absurdo da história. Os meus dois amigos, diga-se, são pessoas com credibilidade, bem integradas nos meios culturais, que conviveram com A. Sena.

Somadas as informações, parece admissível que seja o próprio António Sena (o Toé que foi o animador da galeria Ether - ver saisdeprata-e-pixels.blogspot.pt/2008) a pôr a circular os boatos sobre a sorte da colecção, a qual não deve ser entendida apenas como seu património particular mas sim como um acervo único e decisivo, insubstituível, sobre a história da fotografia em Portugal: um país em que abundam negativos à mercê de quaisquer aventureiros, e falta o que é essencial, as provas de autor e de época, e também as publicações e catálogos de referência, ausentes nas bibliotecas.

duas páginas do catálogo "Olho por olho", Ether, 1992

sábado, 10 de novembro de 2018

João Francisco na 111, 2018


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Transcrevo um mail do João Francisco sobre a exposição Mille-fleurs que hoje (10 de Novembro) chega ao fim.

"Eu não sei se posso dizer que o tema dos refugiados e dos naufrágios seja o principal ou o único da exposição [ não, não é o único, talvez não seja o principal, mas é aquele que mais intensamente atinge o observador, logo no espaço inicial da exposição, quando se começa a identificar a presença dos migrantes e dos mortos do Mediterrâneo; não é rápida essa identificação, ela é elidida pelo autor e talvez a evitemos, porque a arte não trata dessas coisas... Só mais tarde, ao tentar escrever sobre a exposição, o assunto se me tornou evidente, irrecusável.] O ponto de partida foram de facto as tapeçarias mille-fleurs, que realmente admiro e que me intrigam. A vontade de fazer algo a partir delas era já antiga. E o painel grande com as flores e os animais mortos foi o que inicialmente surgiu dessa referência (e que nesse sentido talvez se possa dizer que a ela mais esteja preso).
As outras pinturas da exposição surgiram autónomas a esta peça maior mas mantendo, para mim, esta procedência:
- por um lado na série mille-fleurs (as colagens sobre os desenhos de bordados reutilizados) onde se joga com a ideia de "cartão", ou seja, de algo que está a meio caminho entre a ideia e um outro objecto final a realizar, e onde sigo mais ou menos o aparato das tapeçarias referidas: um motivo central rodeado de elementos pequenos, mais ou menos parecidos, no que vejo também uma ironia com a repetição tão cara ao minimalismo. Interessou-me explorar a relação entre o que eu pintei e os elementos já existentes nas páginas encontradas, essa conversa entre o novo e o antigo, a passagem do tempo também, no fundo. Tudo isto tendo em conta a ironia e o anacronismo que consiste em falar hoje de uma forma de arte completamente morta e especifica como é a da tapeçaria. (que acresce também ao facto de ser já eu um pintor de "naturezas mortas" , um género "menor");
- e por outro nas pinturas a acrílico mais pequenas ("as paisagens"), que exploram temas que poderiam também ser motivos para tapeçarias (substituindo-se às cenas épicas de batalhas, mitologias, paisagens mais ou menos exóticas).
Tendo dito isto, o tema dos refugiados e dos naufrágios tornou-se bastante importante, aparecendo várias vezes, bem como pela primeira vez a inclusão de corpos, ou fragmentos deles (quase sempre o meu) , que interagem com os objectos estáticos da natureza morta, ou que parecem fazer um comentário à "acção".

É também como diz, senti que era um assunto delicado e melindroso, em relação ao qual tive muitas dúvidas durante o processo - se devia ou podia ser explorado - , e que achei melhor não nomear (embora o tenha feito indirectamente nos títulos: " o náufrago", "figura a observar um naufrágio", "no mediterrâneo", "sob as ondas").
Agrada-me também, como lhe disse, esse desafio de deixar, dando algumas pistas, que o espectador entre no jogo, em vez de explicar e dissecar por completo as imagens (prefiro que elas interpelem o espectador, que criem um diálogo). Interessa-me no fundo que as imagens vivam por si e sejam eficazes, e que não sejam meras ilustrações de uma ideia inicial ou literária. E daí as pinturas evocarem o drama dos naufrágios sem reproduzirem ou partirem das imagens deles com que somos regularmente confrontados (a construção no atelier destas amálgamas de corpos e ondas, em substituição dos reais, acaba por não me parecer menos trágica e inquietante). São no fundo coisas muito fora de moda e nada contemporâneas: símbolos, alegorias. Um pouco como as estátuas dos "duplos" do antigo Egipto.
Mais do que o drama específico no Mediterrâneo talvez seja a morte, e o tempo, um dos fios condutores da exposição. Ela aparece em algumas das paisagens (as paisagens onde surgem caveiras aludem às fantásticas imagens, maioritariamente medievais/renascentistas, do juízo final, onde o inferno é mostrado muitas vezes como um monstro de enorme boca aberta por onde entram as pobres almas condenadas....); no "Lázaro", que estando morto volta à vida; nas velas, acesas ou apagadas; nas flores, frescas ou murchas, reais ou artificiais; no Mársias, esfolado vivo como castigo; no próprio painel "mille-fleurs", no diálogo entre os animais mortos e as flores aparentemente vivas (ainda, mas isso é um jogo antigo da pintura de naturezas-mortas....).
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Sem título - mille-fleurs (1. pinceladas numa paisagem/ 2. Lázaro / 3. as pinceladas flutuantes / 4. debaixo das ondas), 2018

E leia-se a "folha de sala" escrita pelo João Francisco:

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O assunto que talvez possa agregar o conjunto de pinturas recentes que aqui se apresentam é o da paisagem. Apesar de serem assumidamente naturezas-mortas, na medida em que consistem em objectos reais, dispostos e observados, estas imagens olham para o exterior, lá para fora. Falam de montanhas e desertos, do mar e de florestas, de ruínas, de jardins. Olham também através deles para o interior (não serão as paisagens aí ainda mais perigosas e sombrias?).
O título da exposição e muitas das peças apresentadas partem de um tema que importa explicar: mille-fleurs ou mil flores. É o termo utilizado para agrupar um conjunto de tapeçarias produzidas no norte da França e na Flandres sensivelmente entre o final da Idade Média e o início do Renascimento. O que as torna num grupo específico é o uso que fazem, de forma
repetitiva e obsessiva, da representação de flores e plantas que, rodeando por completo os elementos em destaque (que podem ir de damas com unicórnios a caçadores, personagens galantes ou mitológicas), criam um espaço mais mítico que natural, mais caracterizado por uma exuberância decorativa que pela sugestão de uma paisagem real onde as figuras se inserem. Estas representações de flora, a que muitas vezes é também adicionada a presença de pequenos animais, são no entanto extremamente fiéis: são reconhecíveis com facilidade as espécies de planta selvagens e de cultivo doméstico, o que anuncia a cultura humanista e científica do Renascimento.
Realizado ao longo de vários meses o vasto conjunto de pequenas pinturas mille-fleurs pode ser entendido simultaneamente como memória desse tempo que passa, e como retrato de um espaço específico, de um jardim, registando e mostrando o que lá cresceu e morreu. Assimilando a estrutura formal das referidas tapeçarias em que as plantas se encadeiam de forma regular criando como que uma grelha, esta peça é uma afirmação do fascínio que a natureza, por mais remota ou doméstica, real ou mítica que seja, continua a realizar.
A descoberta fortuita de um conjunto numeroso de esquissos utilizados para bordar despoletou outro conjunto de peças: nessa memória ou fantasma dos desenhos que foram passados para um outro suporte têxtil, reconheci a dos “cartões” das tapeçarias, modelos em tamanho real do que iria ser tecido e que, devido à constante e violenta utilização, raramente sobreviveram (e de que os cartões para os Actos dos apóstolos de Rafael são uma notável excepção). Criando um fundo relativamente homogéneo a colagem destes desenhos, todos referentes com graus diversos de realismo e estilização a plantas, permitiu a construção de um campo onde a pintura acontece. É neste jogo entre o que se oculta e o que permanece visível que estas páginas encontram sentido.
Falando das paisagens em si talvez as vejamos como pessimistas e escuras. Por vezes inquietantes e inóspitas. Possivelmente também irónicas ou ridículas. Talvez tenham de ser assim. Fazendo minhas as palavras de Bernard: (...) e saí para a rua sozinho, de impermeável vestido, e as montanhas eternas fizeram-me sentir enjoado e nada sublime (Virginia Woolf, As Ondas)."

Se o João Francisco fosse um candidato a artista minimal-conceptual diria, ele ou algum curador por ele, que "reflecte sobre"... Mas ele não diz, nem sugere, pelo contrário, entrega-nos à nossa eventual vontade de atenção / interpretação ou à nossa cegueira. Quem pensará que uma obra de arte aborda (trata de..., tem por tema) assuntos sérios, e não é só a apropriação indiferente de uma imagem mediática ou um 'mero' exercício auto-referencial, dedicado à ideia de arte e à tradição da sucessão de formas (novas?), referido à 'soberania' da arte e ao 'Mundo da Arte' (como se lê com maíuscula e aparente convicção à entrada do ex-CAM, actual Museu Gulbenkian - "Anos 2000", dizem eles).
O João Francisco não explica sobre (o) que 'reflecte'; pelo contrário, vai apontando para outras pistas, que teremos de seguir antes e depois de descobrirmos o assunto mais forte das suas obras recentes.
Ele não refere os retratos e auto-retratos que lá estão; não sinaliza as 'vanitas' (variedade de naturezas-mortas que nos confrontam com a morte); não fala de pintura de história, que já não se povoa de mitologias e realezas mas se enfrenta ao quotidiano, à política, à história em que vivemos.
Alguém terá já tratado em pintura os dramas dos migrantes e refugiados africanos que se afundam no Mediterrâneo? É o que faz o João Francisco. E é muito forte.
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IMG_9366 Sem título - nas ondas / um náufrago / a torrente, 2008
Dez anos depois da 1ª exposição, já na 111, o João Francisco conserva algumas características centrais do seu trabalho: a natureza-morta, pintura e desenho de observação diante de modelos/paisagens que constrói, a partir de uma prática e recolector - coleccionador. E essa prática da natureza-morta é também comentário ou releitura da história da arte, com extensão às referências literárias. É uma produção erudita mas que se vê (também) como prática brincada, às vezes próxima da banda desenhada pelo grafismo das formas e perspectivas. 
Aos actuais desastres e naufrágios mediterrânicos podem associar-se as anteriores paisagens marítimas de J.F. que já eram trágico-marítimas ("Atlântida" e "Tempestade em Trouville - para E. Boudin", ambos de 2008) e também, de outro modo, as Ondas e Objectos flutuantes de uma exposição de 2014, e ainda a instalação "Sem título - trazido pelo mar para Joseph Cornell", de 2005/2012. Tudo se prolonga e reactualiza com novas referências e circunstâncias. Entretanto - mutação muito significativa, que deixa abertos novos passos -, a observação pode ser também imaginação, a natureza-morta acolhe o retrato do natural, usando o espelho e já não a imagem prévia.
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"Sem título - Tempestade em Trouville - para E. Boudin", 2008, óleo sobre tela, 160 x 180 cm.
Joao mar

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Quatro fotógrafos de Moçambique no Paris Photo / Quatre photographes du Mozambique - Ricardo Rangel, José Cabral, Mauro Pinto, Filipe Branquinho

Ricardo Rangel foi o pioneiro da fotografia de Moçambique e o mestre reconhecido de várias gerações de fotógrafos. A sua longa carreira (1924, Lourenço Marques - 2009, Maputo) impôs-se desde os anos 1950 na imprensa colonial, onde foi o primeiro fotojornalista não branco, e conheceu uma dinâmica sempre ascendente, apesar da sua orientação política contrária ao regime.
Mestiço, de ascendência grega, africana e chinesa, dotado de uma personalidade forte e brilhante profissional, beneficiou da transigência táctica do poder colonial que desejava acolher elites locais alternativas à pressão dos extremistas brancos e às ambições dos nacionalistas negros. A repressão política poupou-o e a censura nunca o silenciou, mesmo se algum trabalho terá desaparecido. Foi depois uma figura de referência no Moçambique independente (pós-1975). Atravessou o socialismo, a guerra civil e a normalização política, sempre como uma voz independente, crítica da imprensa oficial e desde 1981 à frente do Centro de Formação Fotográfica, que dirigiu até à sua morte.

A afirmação internacional de Rangel começou em 1994, logo no primeiro tempo da descoberta da fotografia feita por africanos - Moçambique foi então um país em foco. Nesse ano a cooperação francesa editou um primeiro livro, «Ricardo Rangel, Photographe do Mozambique» (Éd. Findakly, Paris), que o mostrava como crítico da sociedade colonial, autor de imagens emblemáticas sobre a diferenciação racial e social, repórter atento aos bairros negros e também aos brancos pobres. E logo nos 1ºs Encontros de Bamako, no mesmo ano, a outra vertente mais oculta da sua obra, dedicada às mulheres dos bares do porto de Lourenço Marques, nos anos 60/70, com uma notória cumplicidade sensual, foi apresentada pela Revue Noire. A série «Notre pain de chaque jour, les nuits de la Rue Araújo» foi depois consagrada por Enwezor Okwui na exposição «In/sight. African Photographers, 1940 to the Present» (Guggenheim Museum, 1998), e veio a ser publicada em livro em 2005: «Pão Nosso de Cada Noite» / "Our Nightly Bread» (ed. bilingue, Marimbique, Maputo).

José Cabral é o outro pioneiro da fotografia moçambicana, situado entre a dinâmica colectiva do fotojornalismo inspirado por Rangel e a nova geração de fotógrafos-artistas que tem alcançado circulação internacional, de que fazem parte Mauro Pinto e Filipe Branquinho. Mas Cabral foi um mestre diferente - irreverente, individualista, indisciplinado.
Com uma obra original desde que em 1975 trabalhou como fotógrafo no Instituto Nacional de Cinema, a que se seguiram alguns poucos anos como reporter fotográfico, realizou encomendas documentais e foi professor influente no Centro de Formação Fotográfica, de 1986 a 1990. É um artista das margens, por vezes revoltado e irascível, o que as suas fotografias não deixam adivinhar, na serenidade dos seus itinerários por Moçambique e na ternura com que olha as pessoas dos seus inúmeros retratos. E é o homem da ruptura, que veio trazer ao colectivo da fotografia de Moçambique a necessidade do discurso pessoal, fundado no conhecimento da fotografia internacional, nas viagens e emainteresses culturais alargados.

A diferença da sua obra foi sendo sublinhada pela referência autobiográfica presente em grandes exposições construídas como antologias pessoais: «As Linhas da Minha Mão", 2006, Maputo (com homenagem a Robert Frank no título); "Urban Angels / Anjos Urbanos", 2009, Lisboa e Maputo (as crianças, os seus filhos e os dos outros); "Espelhos Quebrados", 2012, Maputo (auto-retratos que sinalizam percursos de vida e de criação).  Foi uma contribuição corajosa para pôr em evidência o papel e o lugar de quem vê e fotografa, como artista que intervém no presente de um país em mudança.
A actualidade de Cabral não foi a guerra civil, a violência urbana ou a miséria quotidiana - é sempre a da vida comum e é de um olhar mais profundo e definitivo que se trata, à distância de muita fotografia africana que balança entre a vitimização e o exotismo. Não há lugar na sua obra para retóricas fotográficas formalistas e o discurso pessoal nunca é indiferente à realidade do país - é um acto interveniente, lúcido e livre. Uma antologia do seu trabalho foi publicada em 2018 no livro «Moçambique» (ed. XYZ Books, Lisboa, e Kulungwana, Maputo).

Mauro Pinto e Filipe Branquinho são dois jovens fotógrafos com ampla circulação internacional, ancorados na realidade de Moçambique e renovando projectos documentais.
O primeiro, Mauro Pinto (n. 1974, Maputo), estudou em Johannesburg e desde 2000 que participa em exposições colectivas e festivais em Moçambique, Angola, África do Sul, Brasil, França, Noruega, Ilha da Reunião e Portugal - onde venceu o Prémio BES Photo 2012, com a série «Dá Licença» / «Excuse Me», realizada no bairro popular de Mafalala em Maputo. O seu trabalho combina projectos de longo fôlego de índole documental e imagens isoladas e sintéticas onde se concentram situações algo enigmáticas, efeitos de contraste e surpresa que desafiam a atenção do espectador, e em que o humor está também muito presente. É uma via para questionar com grande eficácia visual a prática da criação visual - o que é a arte e o testemunho, a comunicação e a informação. Uma série recente mostrou máscaras de folhas e penas do Burkina Faso sob o título «Ç’est pas facile»

Filipe Branquinho (n. 1977, Maputo) tem formação em arquitectura e segue uma dupla carreira de fotógrafo e ilustrador. Num projecto agora em curso, intitulado “Lipiko”, em que utiliza máscaras mapiko de tradição maconde, associa desenho e fotografia com um forte sentido de sátira para propor a reflexão sobre aspectos e valores da actualidade nacional. Nas séries anteriores têm-se sucedido projectos fotográficos que propõem a leitura da realidade actual de Moçambique, em geral sobre a identidade urbana, as pessoas e o seu espaço na cidade, entre memórias e o presente, a actualidade nacional e a tradição: "Ocupações" (retratos de habitantes anónimos nos seus lugares de trabalho ou de vida - PHOTOQUAI 2013 e Revue Camera, Paris, nº 2, 2013); «Showtime», 2013 (retratos de mulheres num regresso à Rua Araújo que evocava Rangel e Cabral); «Interior Lanscapes» (arquitecturas de Maputo e a reutilização de velhos espaços do tempo colonial - Prémio POPCAP 15 de Fotografia Africana); «Gurué 15° 28‘ S 36° 59’ E“ (as imensas paisagens do chá na Zambézia). É um trabalho com evidente coerência temática e sempre sem concessões à facilidade ou ao exotismo

Moçambique é um país de muitos notáveis fotógrafos e outros nomes se têm afirmado ao longo do tempo, com especial destaque para Kok Nam (1939-2012, parceiro de Rangel), Moira Forjaz (vinda do Zimbabwe), Sérgio Santimano, João Costa (Funcho), Luís Basto, Mário Macilau. Mas é também um país pobre com escasso mercado interno, distante e isolado pela língua, fechado sobre a doçura do seu quotidiano e a beleza natural, que tem permanecido quase alheio aos trânsitos artísticos internacionais. Quatro fotógrafos - Rangel, Cabral, Pinto e Branquinho -, abrem aqui as fronteiras de Maputo.

Alexandre Pomar

 

Quatre photographes du Mozambique


Ricardo Rangel a été le pionnier de la photographie au Mozambique et le maître reconnu de plusieurs générations de photographes. Fort de sa longue carrière (1924, Lourenço Marques - 2009, Maputo), il a su s’imposer dans la presse coloniale depuis la fin des années 1950, où il fut le premier photojournaliste non-blanc. Il a connu une évolution croissante malgré son orientation politique contre le régime.
Métis, d'ascendance grecque, africaine et chinoise, doté d'une forte et brillante personnalité professionnelle, il a bénéficié du compromis tactique du pouvoir colonial souhaitant accueillir les élites locales, alternatives à la pression des extrémistes blancs et aux ambitions des nationalistes noirs. Il a échappé à la répression politique sans jamais être réduit au silence par la censure, même si certains de ses travaux auraient disparu. Il fut un personnage de référence au Mozambique indépendant (après 1975). Il a traversé le socialisme, la guerre civile et la normalisation politique, toujours en tant que voix indépendante, critique de la presse officielle et depuis 1981 à la tête du centre de formation photographique (Centro de Formação Fotográfica) qu'il a dirigé jusqu'à sa mort.

L’internationalisation de Rangel a commencé en 1994, lors de la première découverte de la photographie faite par des africains. Le Mozambique était alors au centre des attentions. La coopération française publia cette année-là un premier livre, "Ricardo Rangel, photographe du Mozambique" (Ed Findakly, Paris), qui le décrivait comme le critique de la société coloniale, auteur d'images emblématiques sur la différenciation raciale et sociale, reporter à l’écoute des noirs et aussi des blancs pauvres. Dès les premières Rencontres de Bamako (Encontros de Bamako), la même année, l'autre face plus cachée de son travail, dédiée aux femmes des bars du port de Lourenço Marques, dans les années 60/70, avec une complicité sensuelle notoire, a été présentée par la Revue Noire. La série de photos intitulée "Notre pain de chaque jour, les nuits de la Rue Araújo" a ensuite été consacrée par Enwezor Okwui lors de l'exposition "In/sight. African Photographers, 1940 to the Present" (Guggenheim Museum, 1998) et également publiée dans un livre en 2005 : " Pão Nosso de Cada Noite" / "Our Nightly Bread " (ed. bilingue, Marimbique, Maputo).

José Cabral est l’autre pionnier de la photographie mozambicaine, situé entre la dynamique collective du photojournalisme inspirée par Rangel et la nouvelle génération d’artistes photographes qui ont atteint un rayonnement international, comme Mauro Pinto et Filipe Branquinho. Mais José Cabral était un maître différent - irrévérencieux, individualiste, indiscipliné. Photographe depuis 1975 à l'Institut national du film (Instituto Nacional de Cinema), puis photoreporter pendant quelques années, il a également réalisé des documentaires et fut enseignant au centre de formation photographique (Centro de Formação Fotográfica) de 1986 à 1990. José Cabral est un artiste en marge, parfois en colère et irascible, ce que ses photographies, dans la sérénité de ses voyages au Mozambique et dans la tendresse avec laquelle il regarde les personnages de ses nombreux portraits, ne laissent d’ailleurs pas deviner. Il est l'homme de la rupture, qui est venu apporter au collectif de la photographie du Mozambique la nécessité d'un discours personnel, fondé sur la connaissance de la photographie internationale, les voyages et les intérêts culturels.

La différence de son travail a été soulignée par la référence autobiographique présente dans de grandes expositions construites comme des anthologies personnelles : "As Linhas da Minha Mão", 2006, Maputo (avec un hommage à Robert Frank dans le titre) ; "Urban Angels / Anjos Urbanos", 2009, Lisbonne et Maputo (avec ses propres enfants) ; "Espelhos Quebrados", 2012, Maputo (autoportraits représentant des parcours de vie et de création). Un travail courageux pour souligner le rôle et la place de celui qui voit et photographie, en tant qu’artiste intervenant dans le présent d’un pays en mutation.
Les sujets choisis par José Cabral n’étaient pas la guerre civile, ni la violence urbaine ou la misère quotidienne, mais plus la vie quotidienne avec un regard plus profond sur les choses, à la différence de beaucoup de photographies africaines qui oscillent entre victimisation et exotisme. Son travail lucide et libre, basé sur la réalité du pays ne laissait pas de place à la rhétorique photographique formaliste. Une anthologie de ses travaux a été publiée en 2018 dans le livre "Moçambique" (éd. XYZ Books, Lisbonne et Kulungwana, Maputo).

Mauro Pinto et Filipe Branquinho sont deux jeunes photographes de portée internationale, ancrés dans la réalité du Mozambique et renouvelant des projets documentaires. Le premier, Mauro Pinto (né en 1974 à Maputo), a étudié à Johannesburg et participe depuis 2000 à des expositions collectives et à des festivals au Mozambique, en Angola, en Afrique du Sud, au Brésil, en France, en Norvège, à la Réunion et au Portugal, où il a remporté le prix BES Photo 2012, avec sa série de photos "Dá Licença" / "Excuse Me", réalisée dans le quartier populaire de Mafalala à Maputo. Son travail associe des projets de longue haleine de type documentaire à des images isolées concentrant des situations quelque peu déroutantes, des effets de contraste et de surprise qui défient l'attention du spectateur et dans lesquels l'humour est également très présent. Une manière efficace pour Mauro Pinto de remettre en question la pratique de la création visuelle : qu'est-ce que l'art et le témoignage, la communication et l'information… Une série de photos récente a montré des masques de feuilles et de plumes du Burkina Faso intitulée "Ç’est pas facile".

Filipe Branquinho (né en 1977 à Maputo) est diplômé en architecture et poursuit une double carrière de photographe et illustrateur. Dans un projet en cours intitulé "Lipiko", dans lequel il utilise des masques en mapiko de tradition Maconde, il associe le dessin et la photographie à un fort sentiment de satire pour proposer une réflexion sur les aspects et les valeurs de la société. Dans ses projets photographiques précédents, il a proposé une lecture de la réalité actuelle du Mozambique, autour de l'identité urbaine, des habitants et de leur espace dans la ville, entre la mémoire et le présent, l'actualité nationale et les traditions : "Ocupações" (portraits d'habitants anonymes sur leurs lieux de travail ou de vie - PHOTOQUAI 2013 et Revue Camera, Paris, n°2, 2013) ; "Showtime", 2013 (portraits de femmes lors d'un retour à la Rua Araújo évoquant Rangel et Cabral) ; "Interior Lanscapes" (architecture de Maputo et réutilisation d'anciens espaces de l'époque coloniale - Prix POPCAP 15 de la photographie africaine) ; "Gurué 15 ° 28 'S 36 ° 59' E" (les immenses paysages de thé en Zambézie). Un travail construit autour d’une thématique cohérente et évidente, qui ne cède pas à la facilité ou à l'exotisme.

Le Mozambique est un pays de nombreux photographes notables et d'autres noms se sont affirmés au fil du temps, avec un accent particulier sur Kok Nam (1939-2012, partenaire de Rangel), Moira Forjaz (originaire du Zimbabwe), Sérgio Santimano, João Costa (Funcho), Luís Basto, Mário Macilau. Mais c’est aussi un pays pauvre avec un marché intérieur rare, distant et isolé par la langue, fermé sur la douceur de sa vie quotidienne et la beauté de sa nature, sans grand lien avec les transits artistiques internationaux. Quatre photographes - Rangel, Cabral, Pinto et Branquinho - ouvrent ici les frontières de Maputo.

Informação da Galeria MAGNIN-A