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segunda-feira, 19 de julho de 2010

ESBAP – SNI, 1959 (Magnas e Extra-Escolares)

 

e o grupo de gravadores “21 g 7” e a Divulgação em 1959, a Árvore em 1963

 

Europa013 

capa de Ângelo de Sousa

catálogo: I Exposição dos alunos da Escola Superior de Belas Artes do Porto. Lisboa 30 Junho a 12 Julho 1959 no S.N.I. – subsidiada pela Fundação Calouste Gulbenkian.

(da feira de alfarrabistas da Rua Anchieta, 17 Jul. 2010)

Júri de admissão: arq. Carlos Ramos*. pintor Dordio Gomes*. pintor Augusto Gomes. pintor Júlio Resende. escultor Lagoa Henriques. escultor Gustavo Bastos. designados pelos expositores: Martha Telles, Armando Alves. (* escrevem os textos de introdução das áreas de arquitectura e pintura. O de escultura é de Barata Feyo)

comissão organizadora: Leoner Lello, José Grade, Jorge Pinheiro, Luís Demée

arquitectura: Álvaro Ciza (sic) Vieira expõe Habitação no Porto; Alcino Soutinho

Fidelidade003

(Árvore?)

pintura: entre outros, Ângelo de Sousa, António Bronze, Armando Alves, Helder Pacheco, Tito (Reboredo), Jorge Pinheiro, Laureano Guedes, Luís Demée, Manuel de Francesco, Manuel Pinto, Flor Campino, Martha Telles

 escultura: Charters de Almeida, João Barata Feyo, José Grade, José Rodrigues, Maria Clara Meneres

desenho: alguns dos referidos e Diogo Alcoforado, etc

Fidelidade007 desenho

O catálogo tem um excelente arranjo gráfico (não creditado) e inclui um preçário em folha solta. A figuração que predomina é ainda a de uma tradição humanista decorrente do pós-guerra, interessada na solidez das formas, por vezes de filiação neo-realista pela procura da representação do povo (A. Alves).

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Esta é uma mostra que corresponderá certamente à "I Exposição dos alunos da Escola Superior de Belas Artes do Porto". Porto: Escola Superior de Belas Artes, 1959 (e que terá também sido apresentada em Coimbra – com efeito, no cat. "Uma Antologia", de Ângelo Sousa, indicam-se pela ordem Porto, Coimbra, Lisboa). 

Precede a "II Exposição Extra-Escolar dos Alunos de ESBAP: a Mestre Dordio Gomes". Porto, ESBAP, 1960; a III em 1961; IV em 1965; V em 1966; VI em 1967; VII em 1968. Ainda de 1962 é a mostra "Escola Superior de Belas Artes do Porto: [pintura, escultura, arquitectura]: 1958-1962". Porto: Escola Superior de Belas Artes do Porto.

Por outro lado, as "Exposições Magnas da ESBAP" realizavam-se desde 1952 (a I), anualmente sem interrupção, sendo a XIV, em 1965, "de Homenagem a Calouste Gulbenkian no décimo aniversário da sua morte". A última referida é também em 1968, como a VII Extra-Escolar: "XVI Exposição magna da Escola Superior de Belas Artes do Porto. Porto: Escola Superior de Belas Artes, 1968. Exposição de homenagem a Mestre Carlos Ramos".

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O catálogo acima (com a referência SNI, Lisboa) não está referido no site "FBAUP – Contributos para a história de uma Instituição", http://sigarra.up.pt/fbaup/web_base.gera_pagina?p_pagina=2462 (não acessível). No entanto, parece ser um elemento chave para se entenderem quer a afirmação dos jovens artistas formados no Porto quer a alteração das relações Lisboa-Porto e do eixo SNBA-SNI, no quadro de um enfrentamento geracional que se altera exactamente a partir desse ano e em grande medida por iniciativa dos artistas da ESBAP, já no novo contexto criado pela acção da FCG.

Observando a cronologia, esse é o ano da exposição "50 Artistas Independentes em 1959" (SNBA) e do "I Salão dos Novíssimos" (SNI), salões concorrentes que se inauguram no mesmo dia e à mesma hora (Junho?), e igualmente da I Bienal de Paris, cuja representação foi tutelada pelo SNI, em especial com artistas dos Novíssimos e do Porto/Esbap.

António Quadros e Eduardo Luís eram já ex-alunos da ESBAP. O primeiro passa nesse ano de 1959 a reger várias cadeiras na Escola, onde iniciara actividade docente ainda aluno, e o segundo partira para Paris em 1958, como bolseiro da FCG. É um momento em que, entre a I e a II Exp. Gulbenkian, se altera a divisão entre os artistas que continuam a não colaborar ou que passam a colaborar com as iniciativas do SNI, em função de uma nova configuração geracional (em geral, a geração da Pórtico, em Lisboa, com René Bertholo e Lourdes Castro) e de uma posição apolítica dos jovens artistas do Porto formados da excelente  Escola de Carlos Ramos. A representação nas bienais internacionais (Veneza, São Paulo e em especial Paris, logo em 1959, enquanto vocacionada para jovens artistas) é um dos factores influentes nessa viragem.

A exposição que António Quadros realizou no SNI em 1958 (por 3 dias em Julho) terá sido também uma data marcante, acompanhada por uma promoção irreverente ou provocatória.

Fidelidade006  cartaz

A tradição historiográfica nacional (por muito tempo um misto de memórias pessoais e de "oposicionismo" – refiro-me a JAF, pq depois passou a ser uma prática em 2ª mão, sem confirmação de fontes – teve por norma diminuir a importância da actividade artística do SNI, introduzindo excepções a uma história que se oculta e se diz ser "patética": mas há Amadeo em 59, retrospectiva de Resende em 61, Arte Belga em 66, Areal em 67 (e 69), Nadir Afonso e Eduardo Viana em 68. A leviandade informativa é agravada pelo desconhecimento do panorama portuense e pela desvalorização táctica das representações nas bienais internacionais. Ver a este respeito, "Instituições, galerias e mercado" de Gonçalo Pena, em "Anos 60, Anos de Ruptura", Livros Horizonte – Lisboa 94, que será ainda a investigação mais completa sobre a matéria.

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É de 1959/60 (até 1963?) a actividade do "21 g 7", grupo de gravadores integrado por Ângelo de Sousa, António Bronze, António Quadros (autor do respectivo Manifesto), Armando Alves, José Rodrigues e Manuel Pinto. Quadros é o único a ser editado pela Coop. Gravura, em Lisboa, mas só em 1958 e 59 – onde Júlio Resende tem uma presença certa desde 1956.

No mesmo ano de 1959 inicia-se a actividade da galeria Divulgação na livraria do mesmo nome, dirigida inicialmente por José Pulido Valente, arq. (a abertura ocorre de facto em Junho de 1958, com artistas da galeria Alvarez, animada por Jaime Isidoro).

A Cooperativa Árvore constitui-se em 1963, por iniciativa de José Pulido Valente, Calvet de Magalhães, José Rodrigues, Henrique Alves Costa (vindo do Cine-clube, então afastado da direcção devido à hostilidade do PCP), Mário Bonito e outros, sendo A. Quadros um dos seus primeiros impulsionadores. Mas eles não fazem parte do grupo oficial dos dez fundadores-artistas registado no notário: pintores Manuel Pinto, Ângelo de Sousa, Jorge Pinheiro, Domingos Pinho, escultores José Grade, Laureado Guedes, e outros.

O grupo Os Quatro Vintes expõe em 1968, 69 e 70.

ver "[+ de] 20 grupos e episódios no Porto do século XX", Galeria do Palácio, Porto 2001 (vol. I e II)

sábado, 1 de dezembro de 2001

2001, Antonio Quadros

"Um universo maior"

Expresso Cartaz de 1/12/2001, pág 24

António Quadros não cabe de corpo inteiro na exposição que lhe foi dedicada pela Árvore

ANTÓNIO QUADROS, «O Sinaleiro das Pombas» (Árvore, Porto, até 12 de Dezembro)

O ritmo dos eventos da capital cultural não é propício a projectos retrospectivos, que desde a mostra inicial «Porto 60/90» se fizeram com atropelos de investigação e produção. É o que acontece com António Quadros (1933-1994), intrigante personagem que foi pintor e poeta - João Pedro Grabato Dias, entre vários heterónimos - e se dispersou enciclopedicamente por outros interesses, muitos deles levados à prática em Moçambique entre 1964 e 1984.

O programa da exposição foi assumido pela Árvore, que não tinha estruturas nem espaço para tal desafio; adiada até um fim de ano abreviado para outras iniciativas, ficou reduzida a uma convencional exibição da obra plástica e breve catálogo, comissariados por Laura Soutinho e Bernardo Pinto de Almeida, remetendo-se outra parte, presumivelmente mais alargada, para um livro de formato bancário (BPI) e intenção natalícia que só mais tarde terá, se tiver, circulação pública.

Justificava-se uma aproximação que cruzasse as várias vertentes de uma obra e actividade de ambição renascentista, servindo de exemplo a exposição que Serralves dedicou aos múltiplos rostos de Fernando Lanhas, reeditando a sua retrospectiva de 1988. 

Quadros foi um homem de temperamento difícil, sarcástico e talvez irascível, para quem o desafio feito aos «filósofos das brasileiras», logo no seu Manifesto da Pintura de 1958, não era só um arreganho juvenil. Animador de muitos projectos, provocador face aos pequenos poderes locais, foi muitas vezes esquecido, também como poeta, e não é fácil de classificar e conter em esquemas regras pré-definidas.

Expõem-se na sala maior da Árvore pinturas do percurso escolar e algumas outras mais, mas que não bastam para situar uma produção que teve na viragem dos anos 50/60 uma grande visibilidade, mesmo oficial. Não está lá por inteiro o pintor que expôs na última das Exposições Gerais, em 56; na 1ª da Gulbenkian, em 57 (um famoso nu frontal e impúdico, com um dos seus belos rostos amendoados); nos salões dos Artistas do Norte e depois nos Novíssimos, passando da SNBA ao SNI, na 1ª Bienal de Paris, em São Paulo e outros lugares, várias vezes premiado e logo adquirido pelo Museu Soares dos Reis dirigido por Salvador Barata Feyo.

A sua figuração visionária e em contacto com expressões populares (deve-se-lhe a «descoberta» de Rosa Ramalho, que levou a dar aulas na ESBAP, nos tempos de abertura da direcção de Carlos Ramos) podia ser praticada, no Porto, como uma afirmação inovadora já subsequente, como a de Eduardo Luiz, ao abstraccionismo da geração anterior dos Independentes (Lanhas, Nadir, Arlindo Rocha e até Resende), mesmo que não se adivinhasse a «nova-figuração» que se seguiria. Em Lisboa, as lides críticas regiam-se por categorizações e formalismos mais rígidos, opondo a abstracção ao fantasma do neo-realismo, face uma nova geração nascente - Bertholo, Lourdes Castro, Escada, Costa Pinheiro - com quem Quadros expôs na Galeria Pórtico e fora do país, antes e depois de todos estes emigrarem.

Recuperado como surrealista por Cesariny, em 73, o universo imaginário de Quadros participou de alguns climas poéticos de Chagall, com elegância gráfica e decorativa, também em gravura, ilustração e cerâmica, procurando o «potencial mágico» dos fabulários e da arte popular (ao tempo da Antologia da Música Regional e do Inquérito à Arquitectura) para «Pintar Pintura» em oposição «à forma lógica da escola francesa», como dizia no notável Manifesto já citado.

Semelhantes recursos às mitologias locais e aos bestiários fantásticos surgiam na América Latina, por exemplo, com Francisco Toledo e Jorge de la Vega, já depois de terem interessado os artistas Cobra.

Da estada africana o pintor trouxe uma linguagem menos estilizada e de mancha diluída pelo uso do aerógrafo, onde a efabulação é por vezes mais gravemente monstruosa ou ameaçadora. Se o humor não deixava de estar presente, desde logo em títulos como Senhora e Cabra em Ascensão, Dois Saltões, um Articulado, um Zambezelho e um Luso-mimético, aí sereconhece também uma diferente dimensão mais convulsiva e trágica.

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António Quadros

Casa da Cerca, Almada 

Expresso de 9/2/2002 (nota)

Remontada num novo espaço, a exposição que o Porto 2001 dedicou a António Quadros ganhou uma dimensão totalmente diferente. Não se recuperaram as pinturas dispersas que deveriam testemunhar a grande visibilidade irreverente que o pintor teve em exposições e em representações internacionais na viragem dos anos 50/60, mas as mesmas peças disponíveis, diversamente organizadas em sucessivos núcleos, dão plenamente conta da originalidade do seu imaginário pessoal e de um caminho inquieto por múltiplas pesquisas, humores e referências.

Jogando ora na diversidade das técnicas e das direcções de trabalho — a cerâmica, a gravura, o desenho elegantemente estilizado, a pintura de experiência escolar, de inspiração popular ou submersa em lamas informes, os palimpsestos de fantasia e pesadelo (des)realizados pelo uso do aerógrafo —, ora na organização por interesses temáticos, juntando homens silvestres, lobos e lobisomens, cabras e outras «bichezas» imaginárias ou míticas, o itinerário segmentado da exposição, conduzido por uma criteriosa disposição que destaca as peças emblemáticas, tornou-se uma aventura ao encontro de um mundo poético irredutivelmente desalinhado das convenções formais predominantes.

Entretanto, foi publicado pela Árvore um álbum -  «O Sinaleiro das Pombas» -com textos de Amélia Muge, Bernardo Pinto de Almeida, António Cabrita e José Forjaz, onde à produção plástica se acrescentam abordagens dedicadas à produção do poeta Grabato Dias e às múltiplas actividades em Moçambique entre 1964 e 1984. (Até 10 Mar.)