em Roma L'Incisione Contemporânea in Portugallo, Calcografia Nazionale - nos dois casos foi reproduzida nos catálogos, mas terá sido pouco divulgada à época.
Houve
tempos, já democráticos (ou tempos anteriores...), em que a
investigação sobre relações ultramarinas e coloniais (não é o mesmo) se
processava sem que o "primitivismo" ideológico (ou primarismo, o que não
é o mesmo) tingisse a exploração e a exposição dos respectivos
resultados. A informação internacional, designadamente francesa, podia
sustentar referências e conhecimentos. Recuou-se... a partir da FCT e
dos institutos universitários. Acabámos ao nível do Bloco, tal como
aconteceu com a exp. ainda presente no Museu de Etnologia, "Desconstruir
o colonialismo...", com direcção de Isabel Castro Henriques, autora importante num penoso
fim de carreira.
Escreve-se logo a abrir o texto de apresentação:
"A colonização e os fascismos, e o desenvolvimento da cultura e do
consumo de massas no seio do mal-estar da Europa, impulsionaram o
fascínio e a fetichização em torno de culturas que foram consideradas
«remotas», «primordiais», «primitivas», «ingénuas», «arcaicas»,
«selvagens», «primevas», entre outras designações."
Há por aí uma grande amálgama de tempos e factores (colonização, fascismos, cultura e consumo de massas, mal estar da Europa - e acontece que "fascínio" e "fetichização em torno" são pistas inseguras de análise.
Desconsiderar
o iluminismo e as ciências antropológicas, no seu crescimento
sucessivo; a dinâmica complexa das explorações, aventuras e ocupações de
terreno, e das deportações, emigrações e colonatos; em Portugal, o
republicanismo e o progressismo colonialistas à volta da Seara Nova,
mesmo que ainda talvez acriticamente racistas; bem como as contradições
internas do colonialismo e entre políticos de Lisboa e colonos, são
tropelias chocantes que têm aqui curso académico, escolar e
museográfico.
É
certo que a específica perspectiva de trabalho é a valorização
artística do "primitivo", o "primitivismo" moderno, que alimenta uma sequência
de rupturas (o cubismo, o expressionismo, o dadaísmo, a antropofagia brasileira,
etc), mas isso não justifica que se misturem e se recortem e censurem
realidades históricas de contexto.
Não
quis ir a Guimarães, à exposição, para não conflituar com duas
comissárias que me são simpáticas (já tinha ido a Braga ver uma muito
irregular exposição universitária sobre a Lunda e o Museu do Dundo, que
teve outra origem e ficou bem sem catálogo...), mas digo agora que o
catálogo, que finalmente folheei e logo fui comprar pelo discurso visual (textos sintéticos,
graficamente atraente, impr. Maiadouro, 38€, 408 pags, tiragem não
indicada), é um repositório muito vasto de imagens (ilustrações, capas e
cromos) relativas à exploração ultramarina e colonial que vale a pena
percorrer, com o devido alerta quanto à cegueira académica e aos desvios
facciosos.
"Problemas do primitivismo - a partir de Portugal",
Mariana Pinto dos Santos e Marta Mestre (editoras), ed. Centro
Internacional de Artes José de Guimarães / A Oficina CIPRL e Documenta.
Nov. 2024.
Retomo na íntegra o parágrafo inicial: "Pode considerar-se que aquilo que ficou conhecido como «primitivismo» tem uma longa história <estendendo para trás o conceito com o anacronismo necessário>,
mas foi no fim do século XIX e princípio do século XX que se expressou
de forma inequívoca. A colonização e os fascismos, e o desenvolvimento
da cultura e do consumo de massas no seio do mal-estar da Europa,
impulsionaram o fascínio e a fetichização em torno de culturas que foram
consideradas «remotas», «primordiais», «primitivas», «ingénuas»,
«arcaicas», «selvagens», «primevas», entre outras designações. A
apreciação e valorização por artistas, intelectuais e marchands de
objectos vindos de territórios não europeus, na maioria colonizados, mas
também vindos de contextos locais, como a arte popular, a par do
desenvolvimento exponencial das técnicas de reprodução de imagens,
fizeram irradiar a estética primitivista na cultura visual da
modernidade no Ocidente." <aliás, fizeram a modernidade anti-académica do séc XX>
Por
exemplo, há pequenos reparos que apontam ocultações, censuras: chateia-me que a
propósito de Cruzeiro Seixas, que viveu em Angola entre 1954 e 1964, que
"participou activamente no espaço cultural luandense" e nomeadamente
colaborou com o "Museu de Angola", não se refira o patrocínio e o apoio
público do industrial e coleccionador-patrono Manuel Vinhas ("A Cuca é
da UPA, a Nocal é de Portugal", dizia-se). Eram conhecidas e estão
editadas as suas críticas mais ou menos explícitas da política colonial,
de exigências desenvolvimentistas (pp. 300-305 capítulo "Mar
Português", texto de Marta Mestre 303). Mecenas de Luís Pacheco e tantos
outros, os seus discursos, as duas exposições de arte moderna que
patrocinou em Luanda, o livro final "Profissão Exilado" mereciam
presença.
Outro
exemplo: nas páginas dedicadas a José de Guimarães (artesanato
coleccionado, fotografias, pintura), referem-se "os anos que viveu em
Angola" mas omite-se que estava em Angola como militar, engenheiro
militar, durante a guerra colonial (pps. 148-153, capítulo "Ingénuo"; e
286-287, "no contexto da guerra colonial” - não é uma acusação). Já Cruzeiro Seixas viera
embora no início da guerra... J.G. é um caso significativo de duplo
profissional, sempre militar de carreira (de nome José Maria Fernandes
Marques) e artista independente, que frequentou meios da Oposição e veio
a trabalhar na NATO na Bélgica (nada contra a NATO...), o que permitiu
reforçar a sua circulação internacional. Reformou-se como coronel.
FOTO: O Salazar maconde revisto por Pancho Guedes; e na mesma vitrine o cipaio (policia nativo), interrogatório na esquadra (cena de polícia) e vários animais. Foto Mário Bastos/CML. (ver pags 150-159 do catálogo "As Áfricas e Pancho Guedes". Fotos José Manuel Costa Alves.) Aqui págs 162-163 cat. Problemas... )
A versatilidade da orgulhosa população
maconde, que resistiu à invasão alemã da 1ª Guerra, encabeçou a
resistência anti-colonial e em parte se instalou perto de Maputo,
sustentando o regime e mantendo tradições iniciáticas, tem como
especialidade própria a prática da escultura, em aldeias de artesãos que
cumprem encomendas, antes ao gosto colonial e depois ao gosto moderno.
De CASTRO SOROMENHO - A MARAVILHOSA VIAGEM DOS EXPLORADORES PORTUGUESES Lisboa. 1946-8, Empresa Nacional de Publicidade.
E
também o fotógrafo Elmano da Cunha e Costa, advogado, autor de um
metódico levantamento de tipos e costumes em Angola, protegido e
colaborador de Henrique Galvão, expositor no SNI e hostilizado por
Salazar.
E o antropólogo Carlos Estermann, (1889–1976), missionário espiritano que esteve 50 anos baseado no Sul de Angola (1926–1976), com uma grande produção científica
E a
Exposição Angola 1938 que recebeu e intimidou Carmona à chegada a
Luanda, imposta e produzida exclusivamente por forças locais. E o sempre
ignorado Plano de Fomento então aprovado à força mas que ficou
incumprido no tempo da 2ª Guerra.
Tudo foi mais rico e complexo do que querem fazer parecer.
Nas fotos: Tudo* o que eu não li (às vezes consultei) - e uma oportunidade para pôr ordem nas estantes. (*Aliás, é só uma parte)
duas notas bibligráficas que aqui se sinalizam:
MANUEL RODRIGUES VAZ, "Pintura colonial e Salões de Arte em Luanda. Do naturalismo paradisíaco à modernidade", Conferência na Universidade Nova, em Lisboa, a 17 de Maio de 2017.:
http://novaserie.revista.triplov.com/numero_65/manuel_rodrigues_vaz/index.html
Em 1990 expôs ALGÉS-TRAFARIA 1900 na Ether e na FIL O respectivo catálogo tem escassas indicações biográficas.
Em 1991 participa na exposição que António Sena levou à Europália, "Portugal 1890-1990", organizada em dois núcleos, em Charleroi, Musée de la Photographie ,e Antuerpia, Provincial Museum voor Fotografie. No primeiro situaram-se Joshua Benoliel, os "Regards Etrangers" (apresentada por Jorge Calado, a primeira de uma série de mostras com fotografias feitas em Portugal por estrrangeiros); "Les Années de transition 1227-1967", do comandante António José Martins a Jorge Guerra; e Helena Almeida. No segundo, o que A. Sena intitulou "Regards Inquiets (1980-1991)". No catálogo único, bilingue, francês / flamengo, esta secção começa por Helena Almeida e Gérard Castello Lopes e continua com os fotógrafos expostos (ou a expor mais tarde) na Ether: Nozolino, José (Manuel) Rodrigues, Mariano Piçarra, António Júlio Duarte, Rui Fonseca, A.A.S., José Francisco Azevedo, João António Motta, António Carvalho, Daniel Blaufuks, Francisco Rúbio.
Os dados biográficos de A.A.S. no catálogo são extensos e não voltarão a ser indicados em publicações posteriores.
AUGUSTO ALVES DA SILVA (1963)
Né à Lisbonne en 1963, il a vécu à Londres de 1986 à 1989 et vit à Lisbonne depuis 1989.
Photographe.
Il entame des études d'ingénieur civil à l'Instituto Superior Técnico de 1981 à 1984, date à laquelle il abandonne ses études. Il part pour Londres afin de suivre le cours de photographie du London College of Printing, de 1986 à 1989, avec une bourse de la Fondation Gulbenkian.
Il participe à l'atelier 'Photographic contexts... cultural identities?', au Commonwealth Institute, Londres, en 1987.
Il revient au Portugal où il devient photographe pour l'hebdomadaire O Independente, de décembre 1989 à mai 1990. Il collabore régulièrement avec la revue K.
EXPOSITIONS INDIVIDUELLES
Instituto Superior Técnico, Lisboa, 1984
Faculdade de Direito de Lisboa, 1984
Câmara Municipal de Tavira, Tavira, 1985
Museu Municipal Infante D. Henrique, Faro, 1985
Teoartis Galeria/Centro de Arte, Evora, 1985
Algés-Trafaria, 1990, Ether/Urbe, Feira das Indústrias de Lisboa, Lisboa, 1990
Algés-Trafaria, 1990, Ether/Urbe, Ether, Lisboa, 1990
A cidade dos objectos, Centro Português do Design/ Fundação de Serralves, Porto, 1991.
EXPOSITIONS COLLECTIVES
Fotovisão, Lisboa, 1986
V Bienal de Vila Nova de Cerveira, Vila Nova de Cerveira, 1986
Bienal de Lagos, Lagos, 1986
I Bienal de Arte em Sintra, Sintra, 1987
Marking Time, Museum of London, London, 1987
Masks and Faces, The London Institute Gallery, London, 1989
BA Photography Degree Show, London College of Printing, London, 1989
BIBLIOGRAPHIE
Algés-Trafaria, 1990, Ed. Ether/Urbe, Lisboa, 1990 (catalogue)
Design para a cidade, ed. Centro Português de Design/Fundação de Serralves, Porto, 1991 (catalogue)
«La photographie fascine par le danger imminent de se confondre dans une réalité qui, en fin de compte, n'est qu'une représentation.
Cet état de fait et ce pouvoir descriptif en font un moyen puissant pour créer, réfléchir et façonner des idées.
Dans ce sens, le choix des idées qui servent de base à un travail est fondamental pour la pertinence de ce même travail.
Le paysage, dans son sens le plus large, est, surtout, un bien de consommation.
Dans un pays relativement petit comme le nôtre, la non-réglementation et le non-contrôle de son utilisation peuvent, à court terme, avoir des conséquences sociales et économiques graves».
A.A.S.
No catálogo reproduzem-se três fotografias Sem Título da série "Algarve", 1990, de um total de seis provas.
Trata-se de uma série realizada na conclusão do curso em Londres, e foi origem de um conflito com a respectiva tutora. Num tempo de exercícios conceptuais e de apropriação de imagens mediática não lhe era aprovado vir fotografar ao Algarve, que escolhera como tema. Recorreu aos directores do curso e ganhou o recurso, afastando-se das provas aquela professora.
As fotografias expostas foram depois entregues pelo Augusto à Gulbenkian, de que era bolseiro. Mais tarde não aceitou que integrassem a colecção do CAM (e não figuram no seu Inventário) por serem provas de trabalho ou do curso. Julgo que não voltaram a ser expostas.
NOTA: Ao contrário de quase todas as exposições da Europália'91 Portugal, a exposição não foi repetida por cá. Repetiram-se apenas as exposições comissariadas por funcionários do Instituto Português de Museus, no quadro das suas funções. Não se entendeu pagar aos outros comissários. Foi uma oportunidade perdida (e única) para se mostrar uma primeira retrospectiva histórica da fotografia em Portugal.
Ver o artigo Europália, "Retrato de grupo", Expresso Revista, 23 de Novembro de 1991
"A. Alves da Silva apresenta uma sequência de seis imagens alternadas de denúncia de situações de degradação da paisagem algarvia, utilizando uma abordagem friamente distanciada e «neutral» em fotografias de enquadramento frontal sob uma luz constante que privilegia uma gama uniforme de cinzentos;"