domingo, 11 de dezembro de 2016

2016, Polémica

 A história inovadora

´Transcrevo do Facebook (de 10 de Dez.) para não perder mais tempo. Com um ou outro acrescento pontual.

1- Já leram a promoção que um conhecido semanário (o Expresso) faz hoje de um des/conhecido historiador de arte (o BPA, catedrático)? É informação? É crítica? É recado? É bairrismo? É publicidade? É uma vergonha. Rais partam o semanário que desce, desce, desce... Fiquei espantado qd vi a revista de um amigo. Como não acreditei, vim a casa digitalizar para guardar as provas do delito (do Valdemar Cruz, um topa a tudo sem competência para se ocupar do tema, mesmo como jornalista generalista).

2- Devo dizer que comecei a ficar incomodado qd recebi um mail assim: "Conversa Pública e Lançamento do Livro
Com <...o autor> (Professor Catedrático na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto) e João Ribas (Diretor Adjunto do Museu de Arte Contemporânea de Serralves)

Com esta obra luxuosa, repleta de belíssimas imagens (mais de 500), <o autor> apresenta-nos uma visão profundamente original e inovadora da História da Arte portuguesa no último século.
Rompendo com muitas das ideias cristalizadas no tempo sobre artistas inigualáveis como Amadeo de Souza-Cardoso, e revelando a genialidade de nomes quase esquecidos, o mais importante crítico de arte da atualidade oferece-nos uma panorâmica, excecionalmente rica e solidamente fundamentada, da receção nacional aos movimentos artísticos do século XX e dos seus protagonistas.
Esta será, daqui em diante, ‘a’ História da Arte portuguesa contemporânea, referência incontornável para artistas, colecionadores, estudantes e amantes de arte.

" 'É com este alfobre de ideias, de conhecimentos enciclopédicos, de finura de observação, de alta cultura não só artística como também filosófica e literária, através de uma escrita sempre elaborada e original, rica de semelhanças e diferenças, que o leitor fica – com as imagens ao lado – habilitado a escolher de entre o ‘museu imaginário’ concebido <pelo autor> as obras que mais gostaria de levar para casa a fim de as colocar no pequeno museu da sua imaginação.' - do prefácio de Manuel Villaverde. " [Mas foi mesmo o MVC que escreveu esta prosa digna de um qq serôdio académico? Não é o Manel que eu conheci.]

Enviado pelo autor do livro, este escrito promocional está também e ainda na Agenda de Serralves: http://www.serralves.pt/pt/actividades/historia-portuguesa-do-sec-xx-uma-historia-critica/ Já tinha esquecido a coisa qd sábado deparei com a Revista do Expresso. Anote-se para a História que alinham nas sessões, no Porto, o João Ribas, o António Guerreiro e o Manuel Villaverde Cabral, e em Lisboa Margarida Acciaiuoli, o mesmo Manel e o José Bragança de Miranda, numa "conversa aberta" moderada por Margarida Brito Alves e Filomena Serra.

3- Pergunta o escriba (V.C.) para entrar na matéria: "Pode um artista integrado na lógica fascista ser em simultâneo um modernista?" (e se dissermos que a "lógica fascista" é em si mesmo modernista? - o perguntador perderá o pé?)

"Há um modernismo fora de Lisboa, porque o regime proibia as manifestações modernistas. Sobretudo a partir de 1931, procura arregimentar os artistas." Vem entre aspas, deve ser do catedrático.
'O regime' já proibia antes de 1931? Já procurava arregimentar os artistas? Mas 'o regime' existia antes de 1931? Ferro antes de Ferro?

'O regime' fazia as suas Exposições de Arte Moderna, no SPN/SNI, por onde passavam os modernos / 'modernistas' existentes, contemporâneos mais ou menos coevos das modernidades moderadas dos anos 30 com curso dominante em todo o mundo, nessa década de reafirmações realistas em diferentes formações nacionais (ver "Années 30 en Europe - Le Temps Menaçant", MAM Ville de Paris 1997) e incluindo surrealistas como Pedro, Dacosta e Cândido (eram do "contramovimento" segundo MVCabral), e até futuros neo-realistas, mas diz-se que "proibia as manifestações modernistas" (as exposições, entenda-se).

"Não se pode dizer que aquele grupo dos neomodernistas lisboetas são pintores modernistas, porque vendiam todos para o regime". Temos aqui um 'must' entre as muitas pérolas. Eram modernos porque expunham no Salão de Arte Moderna e porque se contrapunham aos "botas de elástico" da SNBA (a Sociedade à antiga), como se devia saber, e também eram 'neomodernistas' mas não, nunca modernistas. Vá-se lá entender o que por aí se escreve, inovando, polemicando, contextualizando, e com muitas ilustrações para fazer um coffee table book a dar-se ares de hiustória crítica.
Estranho era o Botas ('o regime') ter comprado a todos - ele saberia? Assinava os cheques sem ver? O Ferro enganava-o? Temos por aí uma nova pista para abordar o fascismo nacional.

Os artistas que trabalharam para António Ferro "não são modernistas, e esta é a primeira grande dissensão relativamente ao critério de França". Etc, por aí fora, sem se perceber se o jornalista percebe o que escreve e o que cita.

Modernismo é uma palavra de uso difícil e variado, que quer dizer coisas diversas, episodicamente, em países e tempos diferentes. Modernista, em princípio, era alguém ou algum movimento que se reclamava como moderno, como do seu tempo, portanto inovador, em geral definindo-se numa "vanguarda", numa corrente, tendência ou estilo que se opunha a outros, anteriores ou diversos. Hoje já não há modernistas, o que torna mais complexo um uso útil do termo: ou é uma categoria precisa na história ou é uma sucessão ± vaga de movimentos e/ou vanguardas que têm só em comum o facto de se substituíram e/ou sobreporem desde meados do séc. XIX aos academismos e salonismos (aos gostos dos Salons) dominantes. Para muitos ficou entendido como modernismo a sua versão tardia e última, formalista à Greenberg. Mas modernismo pode ser também um não-conceito vazio, um saco de gatos, uma rasteira aos incautos, um factor de intermináveis confusões.

ADENDA

Recordo que, entre outros quiproquos, no Expresso e fora, escrevi em 1994 uma crítica sobre a 1ª versão desta mesma história nacional: EXPRESSO Actual, 12 Fevereiro, pp. 15 e 16, sob o delicado título "Borrar a pintura". O sr respondeu na edição de dia 26 (texto não transcrito no local abaixo referido) e eu respondi-lhe na mesma data ("Ponto final"): os interessados podem ler em http://alexandrepomar.typepad.com/alexandre_pomar/2010/01/pol%C3%A9mica-em-1994.html

 

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