sábado, 15 de julho de 1995

1984, 1995, René Bertholo, índice

 René Bertholo 1984 -

1984 Abril
08 - «O jogo das memórias de René Bertholo», DN
14 - «René Bertholo: num quadro há milhões de histórias», entrevista, «Expresso Revista», 14-IV-84.
14 - «O regresso» (R. Bertholo e os outros), «Esta semana», crónica , DN

«René Bertholo», «Expresso Revista», 7-IV-84  e 21-IV-84.
«René Bertholo», «Expresso Revista», 23-IV-88 e 14-V-88.
«René Bertholo», «Expresso Revista», 23-V-92.

«Anos 60/Anos 90», «Expresso Cartaz», 13-VIII-94.

«Contramundos», «Expresso Cartaz», 15-VII-95. - #
«René Bertholo», «Expresso Cartaz», 17-II-96 e 9-III-96. - #
«A máquina de pintar», «Expresso – Cartaz», 14-XI-98. - #
«René Bertholo», «Expresso Cartaz», 17-X-98. - #

RENÉ BERTHOLO
Palácio Galveias - 17-02- 1996
Depois das últimas exposições no Porto, a pintura de R.B. volta a poder ver-se em Lisboa, por iniciativa da galeria Fernando Santos, numa situação em que a sua obra atravessa algumas renovadas direcções temáticas e construtivas, na sequência da passagem de Paris para o Algarve. Entretanto, é uma abordagem retrospectiva que continuará a aguardar-se, conhecida a originalidade com que a sua obra se inscreveu na corrente da figuração narrativa dos anos 60 e o sólido percurso posterior pelos objectos mecânicos e pelo «retorno» à pintura. Ainda que a sua produção se encontre disseminada por colecções de vários países, o que torna o projecto particularmente complexo para a preguiçosa rotina das instituições, há que pôr à prova a respectiva competência... e também o seu sentido das responsabilidades. 

09-03-1996
Em cada quadro há milhares de histórias, disse R.B. numa velha entrevista. O pintor não as «conta»: oferece-nos, pintura a pintura, a possibilidade de fazer de cada personagem, revisitado ou inédito (os «mal-educados», os marcianos, o coelho de Alice revisto por Dacosta,  a Abelha Maia a filha de Costa Pinheiro, os pássaros-aviões), de cada objecto ou lugar, «reais» ou inventados, o suporte de um jogo infindável de efabulações e reencontros. É um outro universo, de R.B. e nosso, que vamos ganhando, devorador de outros universos de fábula e de história, onde, por exemplo, o feijoeiro mágico é árvore da vida, coluna sem fim e pintura de motivos vegetais — natureza morta ou viva? — como há muito não se via. É de inventividade da pintura que se trata, e R.B., que fragmenta as composições com uma nova eficácia, que experimenta inéditas aplicações da cor (as «quadricomias») e a ampliação da escala das figuras, que retoma com outro fôlego alguns temas já experimentados («o quarto da Torre») e alarga a dimensão imaginária, surreal, da sua obra, está num momento particularmente feliz da sua pintura. A exposição, em últimos dias, reapresenta telas já expostas recentemente no Porto («Cartaz», 15-07-95) e acrescenta novas obras.

René Bertholo
Centro Cultural da Gandarinha, Cascais
17-10-1998
Pinturas recentes, de 1996-98 (e não «mais ou menos recentes», que tem outro sentido no texto de apresentação de Carlos França para o livro editado). A uma primeiro olhar poderia estar-se perante uma simples continuidade de trabalho, reconhecendo-se a retoma de soluções de composição experimentadas (a construção do quadro com dois, três, quatro ou mais espaços repetidos, com referência à estrutura da BD e também a Magritte) ou a presença de personagens e elementos figurativos «já vistos». De facto, a pintura de R.B. atravessa uma «fase» em que o aparente reciclar de materiais explode com uma imprevisível liberdade imaginativa, convocando todas as suas memórias para as reinvestir com mais energia e sentido do risco, no ensaiar de novas situações enigmaticamente narrativas (Malabarismos, O Diabo, a Pára-Quedista, Etc., Plantas Locais). O espaço cenográfico desaparece por completo, ao mesmo tempo que a escala dos personagens aumenta (por exemplo, A Heroína, herdada de O Capuchinho Vermelho?, de 94; Sem Sombra de Dúvida e Oh Céu de Agosto, afastando-se aqui da estratégia da acumulação e do horror ao vazio), ou que as construções em fragmentos sucessivos se interpenetram com uma crescente complexidade. Entretanto, é também a fórmula da «quadricomia» que é radicalizada, usando, no limite, apenas as cores azul e vermelho, numa prática da pintura que se diverte com a redução dos seus meios sem se autolimitar no poder de questionar o quotidiano com a irrupção do sonho. (Até 25)  

sábado, 3 de junho de 1995

1995, MÊS DA FOTOGRAFIA LISBOA (um mês em 1993): Lx 95

 "Lx 95" 

Em 1995, assinalou-se assim a inconstância dos (i)responsáveis

 

Quando se anuncia a edição (anual) do PhotoEspaña que em 2007 é comemorativa do 10º aniversário e quando o LisboaPhoto (bienal) se interrompeu ao cabo de duas edições, é oportuno recordar que o Mês da Fotografia de 1993 (onde é que isso já vai...), que aconteceu em Lisboa e sob a direcção de Sergio Tréfaut, também ficara sem a anunciada continuidade (em 1995). Estamos sempre a começar... mal (à atenção de António Costa!).


Tribuna - EXPRESSO/Cartaz de 03 Junho 1995

EM 1993 as Festas de Lisboa foram também o Mês da Fotografia.
No respectivo catálogo, que foi impresso na Suíça, o vereador Vítor Costa, do Pelouro do Turismo, afirmava então que «numa perspectiva de diversificação e inovação, as Festas procuram lançar um acontecimento que se pretende venha a realizar-se no futuro com uma periodicidade bienal». Palavra de vereador.
Em 1995 não há Mês da Fotografia, tal como já se deixara cair em 1994 o programa de «Arte Pública». Era uma iniciativa polémica com grande visibilidade que tornava patente a dificuldade camarária de estabelecer com a arte — a intervenção dos artistas no espaço público, a escultura urbana e a decoração — uma relação que não fosse apenas efémera e instrumental.

A perspectiva da continuidade, que poderia consolidar este período das celebrações tradicionais dos Santos Populares numa dimensão inovadora de festival urbano de base social alargada, articulando diferentes modos de viver a cidade e a cultura (não apenas como estratégia de «animação»), foi sendo sacrificada à falta de memória que convém a cada circunstância. Afinal, 1993 era ano de eleições; em 1995 está-se apenas a meio do mandato. E foi por acaso — a vida cultural portuguesa vive de acasos e de boas vontades — que surgiu o programa da Associação Saldanha, «Mistérios de Lisboa, Monumental 95», a assegurar a necessária marca cosmopolita das Festas e a possibilidade de se enunciar outra nova «perspectiva de diversificação e inovação». Com a retórica sempre fácil dos políticos, Vítor Costa pode dizer dos festejos de 95 que «este programa procura compatibilizar o carácter efémero que caracteriza a Festa, momento de excepção por excelência, e a indispensável continuidade cultural»...

Sabe-se que na sua primeira e única edição o Mês da Fotografia surgiu marcado por um gigantismo de programação que veio a resultar em diversos incumprimentos de calendário e também em custos globais que excederam muito as previsões iniciais.
No entanto, o programa idealizado por Sérgio Tréfaut confirmou a eficácia da fotografia como terreno de cruzamento de inúmeros interesses, movimentou um público muito significativo e articulou à volta de um mesmo projecto uma rede de agentes que iam dos equipamentos estatais às galerias de arte privadas. Foi capaz de inaugurar o CCB com uma grande exposição de Sebastião Salgado e apresentou retrospectivas com uma qualidade pouco habitual entre nós, como as de Robert Doisneau e Tony Ray-Jones no Convento do Beato.
No final de 1994, o mesmo comissário apresentou à CML um novo projecto de programação, possivelmente com níveis de ambição e custos também excessivos para o orçamento municipal. Mas, em vez de negociar esse programa ou de impor outro modelo de organização, Vítor Costa optou por esquecer o que tinha escrito em 1993: «Estou certo de que o sucesso deste primeiro Mês da Fotografia criará as condições necessárias para a sua consagração.»

A questão da fotografia, porém, é apenas um sintoma muito particular numa gestão camarária em que o preço da balcanização é demasiado gritante. As «novas Festas» pretendem revestir-se de uma componente cultural, mas a sua organização depende exclusivamente do Pelouro do Turismo; com o Pelouro da Cultura a jogar noutro campeonato (qual?), o S. Luiz e o Maria Matos acolhem espectáculos diversos e abrem-se as portas do Teatro Taborda restaurado, mas as galerias da Câmara (o Palácio Galveias, a Mitra, a Sala do Risco...) e a Videoteca, a Casa Fernando Pessoa, etc, estão alheadas da programação, mesmo quando se encontrem em actividade.
Se é absurdo que as Festas de Lisboa não possam voltar, depois da experiência feliz da «capital cultural», a envolver em projectos comuns as instituições do poder central sediadas na cidade, ultrapassando-se a guerrilha entre Governo e oposição que a política partidária impõe, numa lógica primária de instrumentalização do aparelho de Estado, muito mais grave é a transferência para o interior de um mesmo executivo municipal dos mesmos jogos de pequena política.

sábado, 28 de janeiro de 1995

Brasil, 1995, CCB, "O Brasil dos Viajantes"

Mosaico brasileiro 

Expresso 28-01-95 


# O BRASIL DOS VIAJANTES

# LÚCIO COSTA

# RUY OHTAKE

# MÁRIO CRAVO NETO

# COLECÇÃO PIRELLI-MASP

Centro Cultural de Belém


Se se queria provar que depois da Capital Cultural o CCB não ficaria de paredes nuas, a abertura simultânea de cinco exposições vindas do Brasil, ontem, e a inauguração, na próxima terça-feira, de «A Pintura Maneirista em Portugal», organizada pela Comissão dos Descobrimentos e antes prevista para o Palácio da Ajuda, constitui uma aposta ganhadora.  

Mas, na sua diversidade temática e na variável ambição dos respectivos projectos, o presente «pacote brasileiro», talvez mais do uma solução de programação, parece também significar o estabelecimento de uma ponte entre o centro lisboeta e os grandes Museus de Arte Moderna de São Paulo (MASP) e do Rio de Janeiro (MAM), que importaria ver continuada nos dois sentidos.

À frente deste progama múltiplo, a exposição «O Brasil dos Viajantes» é o resultado de um ambicioso projecto de revisão e de síntese do que foi, desde a «descoberta» até ao século XIX, a visão europeia sobre o continente sul-americano. Numa montagem cenográfica de grande efeito, do arquitecto Haron Cohen, contando com recursos mecenáticos invulgares, Ana Maria Belluzzo, da Faculdade de Arquitectura e Urbanismo da Universidade de S. Paulo, apresenta um exaustivo levantamento histórico das representações iconográficas produzidas por observadores que se sucederam no tempo com diferentes abordagens ideológicas, científicas e artísticas . 

O olhar sobre o outro (o selvagem e a natureza virgem) é aqui devolvido como num espelho, fazendo regressar da observação do que é descoberto para a identidade de descobridor, enquanto sistema de leitura e código de representação. Dos iniciais testemunhos escritos portugueses (Caminha), e da imediata caracterização da alternativa entre o mau e o bom selvagem (O Inferno, do MNAA, e Adoração dos Magos, do Museu Grão Vasco), passar-se-á em seguida a uma galeria internacional de descrições edílicas ou antropofágicas que antecedem as posteriores atitudes «philosophicas» e naturalistas dos séculos XVIII e XIX, até ao romantismo paisagístico da pintura do século XIX. Reunindo livros e ilustrações, tapeçarias e pinturas, encenando um «Gabinete de Curiosidades» ou abrindo espaços à cartografia e aos tratados de História Natural, esta é uma viagem erudita e empolgante que vem complementar utilmente outras redescobertas do Brasil que têm privilegiado o olhar antropológico sobre o passado colonial.

As outras exposições mantêm a fidelidade do CCB à arquitectura e à fotografia, direcções onde as opções podem ter sido por vezes discutíveis mas que procuram preencher espaços vazíos da programação institucional.   

«A presença de Lúcio Costa» é uma exposição documental sobre «a vida e a obra» do urbanista de Brasília, vinda do Paço Imperial do Rio de Janeiro. À breve apresentação da sua figura maior no quadro  do modernismo arquitectónico do Brasil, lugar que partilhou com Niemeyer, segue-se «A  Arquitectura de Ruy Ohtake», um nome afirmado nos anos 60 e hoje proposto como exemplo do que poderá ser, talvez, um genuíno pós-modernismo brasileiro. 

Quanto à fotografia, o CCB acolhe uma antologia da obra de Mário Cravo Neto e a colecção Pirelli-MASP. O primeiro é um grande fotógrafo brasileiro com circulação internacional (a galeria Módulo já lhe dedicara em 1993 uma exposição individual), cuja obra recente encena enquanto criação escultórica (a pose figurativa modelada pela luz num espaço vazio e negro, em permanentes formatos quadrados de grande qualidade superficial) a visão antropológica de um universo cultural marcado pelos rituais da afirmação do corpo e do domínio das forças do desconhecido.

A exposição colectiva faz uma abordagem parcial ao acervo fotográfico do MASP, iniciado há cinco anos com o apoio da empresa Pirelli. Centrada sobre a criação contemporânea, com algumas contribuições dos anos 50, como as de Geraldo Barros ou Pierre Verger, a mostra é a apresentação de um desígnio em curso; não um levantamento estruturado e exaustivo, mas o panorama aleatório de um recente coleccionismo, onde Sebastião Salgado e, outra vez, Mário Cravo Neto ombreiam com numerosos nomes até agora desconhecidos.