"The nude lies in the centre of Western art"
Inauguração da exposição, dia 9, 5ª feira, a partir das 19h
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Já tem data o leilão de provas vintage e em geral inéditas e ÚNICAS de João Cutileiro, escultor e fotógrafo:

a 23 de Outubro e a favor da Abraço.
E ANTES DO LEILÃO VÃO ESTAR EM EXPOSIÇÃO NA P4 A PARTIR DE DIA 9
http://www.p4liveauctions.com
http://www.p4…limited_editions/…
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João Cutileiro expôs fotografias na sua 1ª exposição, em 1961 (que
foi a 2ª, contando uma em Monsaraz e Évora aos 15 anos, em 1951).
Continuou sempre a fazê-las e, de longe a longe, a mostrá-las.
Além de escultor é fotógrafo, ou faz óptimas fotografias, em especial
retratos. É mesmo um dos nomes certos da revolução fotográfica dos anos
50 e um dos poucos, um dos primeiros, que nesse tempo mostrou
publicamente as suas fotografias. Aliás, João Cutileiro até foi
fotógrafo profissional, já que tratou durante uns anos a fotografia como
uma actividade que podia e devia ser remunerada, no caso de se tratar
de prestação de serviços e resposta a encomendas, para além de
fotografar por gosto amigos e amigas. Construiu assim uma galeria de
retratos que fixou uma geração, ou duas, e deixou registados os tempos
de liberdade em Londres (1955-1970).
Também foi e é às vezes um fotógrafo de esculturas, as suas.
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Em Novembro de 1961, na Sociedade Nacional de Belas Artes, o folheto
que acompanhou a mostra não trazia reproduções (o autor informa que eram
praticante todas retratos). Mas teve título: "25 Esculturas / Fotografias / Desenhos de João Cutileiro".
Dos "modernos" ou novos desse tempo, tinham mostrado fotografias em
exposições individuais de galeria só o Fernando Lemos (em 1952-53) e a
dupla Victor Palla/Costa Martins (1958). Foi um pioneiro, portanto.
Um segundo passo público (publicado, neste caso) foi dado só dez anos
depois (1971) com a impressão tardia de algumas imagens de Monsaraz (as
mais antigas de 1959 e outras de 63, estas expressamente feitas) no
livro do irmão José Cutileiro A Portuguese Rural Society
(Oxford, Clarendon Press), onde se publicaram também outras fotografias
do então desconhecido Gérard Castello-Lopes (era conhecido como crítico
de cinema, e tinha mostrado 30 fotografias no pavilhão português da
Exposição de Osaka, no ano anterior). Essas fotografias documentais de
João Cutileiro eram então "neo-realistas" em sentido lato – mas os
retratos de 1961 e os nus que agora se conhecem escapam a todas as
classificações. Estas últimas são fotografias do quotidiano, gestos de
amizade e amor, descobertas de corpos (explorações físicas antes de
serem estudos de formas), momentos de vida antes de serem ou não arte.
Algumas daquelas imagens de Monsaraz e outras mais foram republicadas
e expostas em 2005 e 2006 por iniciativa da Fundação PLMJ (Em Foco. Fotógrafos portugueses do pós-guerra, ed. Assírio & Alvim e mostra no Museu da Cidade, Lisboa, com catálogo próprio, em reimpressões digitais modernas).
"Domingo, a chegada do fotógrafo, Monsaraz, 1963" – impressão digital, jacto de tinta. Col. Fundação PMLJ, de "Em Foco", 2004
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Muitos mais anos depois voltou a expor por ocasião do Mês da
Fotografia que aconteceu em Lisboa em 1993, e ficou sem continuidade.
Foi na Galeria Valentim de Carvalho: "Memória"
(Fotografias inéditas – Colecção do autor). No catálogo geral
publicaram-se dois notáveis retratos, um de Álvaro Lapa, 1958, outro de
Maria Cabral e Vasco Pulido Valente.
Eram 100 fotografias "vintage",
de 1958 a 1970, que não foram então acompanhadas por qualquer outra
edição. O que sempre se lamentou, até porque além da importância dos
retratos também os retratados tinham razoável notoriedade.
"Álvaro Lapa em casa de António Caldeira", 1958 (cat. Mês da Fotografia)
((Na ocasião sairam duas "notas" no Expresso (foi pouco, mas o programa do Mês era muito intenso): a 29/05/1993 e 05/06/93))
«Memórias»,
retratos (inéditos) de amigos e familiares, 1958-70. As fotos foram-se
perdendo pelas gavetas e pelas paredes (serviram até de alvo para
setas), amareleceram e comeu-as o bicho. Juntas agora, traçam uma
galáxia de relações, amizades e amores que veremos ao sabor das
identificações disponíveis a cada um: Fernando Mascarenhas (em 65),
Jorge Sampaio e Karin Dias, João Cid dos Santos, Francisco Keil do
Amaral, Ana Viegas, Maria Cabral e Vasco Pulido Valente, Mário Cesariny
(uma parede com seis fotos de 64), Menez (Londres, 63), Reg Butler, José
Cardoso Pires (60), Ruy Cinatti, Gérard Castello-Lopes, etc, e um
auto-retrato legendado «Paul Newman». Por vezes, as cabeças deixam
adivinhar um olhar escultórico, a caminho de outros retratos (Helder
Macedo, Azevedo Gomes, Keil do Amaral). Com os retratos de Lemos, tão
diferentes, estas fotos privadas levantam um véu sobre um passado
oculto, aqui apercebido como um tempo feliz. São pequenos grandes nadas.
100
fotografias que traçam um percurso de cumplicidades pessoais, mostradas
em provas de época que transportam as memórias do seu uso (as paredes,
os álbuns, o tempo) e um seguro valor de documento sobre os meios
intelectuais do seu tempo. Mas é também a procura do sentido do retrato
que nelas se encontra, na diversidade dos enquadramentos e das poses
«colhidas do natural», ao mesmo tempo que o olhar do escultor se
adivinha. Cutileiro mostrara fotografias numa exposição em 1961 e fez
parte da geração dos «olhares inquietos» (António Sena) — foi mais um
passo na recuperação de uma indispensável memória fotográfica.
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Mário Cesariny em Londres, 1968/69 (De "Londres e Companhia")
Uma dezena desses ou outros retratos foram publicados já em 2004 num livro de memórias de Londres de Luís Amorim de Sousa – Londres e Companhia,
ed. Assírio & Alvim, aí se acrescentando um belíssimo encontro com
Doris Lessing. Alguns também estiveram expostos no Centro Culturais de
Cascais ("Memorabilia", com desdobrável, Nov.-Dez. 2005)
Doris Lessing, 1963. (De "Londres e Companhia")
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Entretanto, no Museu de Évora, em 1999, apresentou-se "Flores – Esculturas de João Cutileiro – Homenagem a Mapplethorpe". No
catálogo publicaram-se 13 fotos suas de esculturas a preto e branco e
de página inteira, sendo as do catálogo final de João Cutileiro Junior,
com textos de Hellmut Wohl, João Caraça e José Monterroso Teixeira. Das
fotografias de flores de Mapplethorpe às flores construídas em mármores
e bronze, a cores, somando-se imagens vistas às flores tiradas do
natural, e depois refotografadas a preto e branco pelo escultor.
Escultura de câmara – a pequena escala e a máquina de ver.
No Expresso Actual publiquei uma entrevista sob o título "De Mapplethorpe a Cutileiro", a 18 de Dez.: http://cutileiro-1999—entrevista.html , e Jorge Calado escreveu a 15 de Jan. 2000 "Flores são flores são flores"
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Por fim (até agora, e se não faltou mais
nada pelo caminho), regista-se em Agosto de 2004, na Casa das Artes de
Tavira, a exposição "Homenagem a Gustave Courbet"
"Homenagem a Courbet 10", 2004
fazendo o título e as fotografias púbicas explícita referência ao preciso quadrinho intitulado A Origem do Mundo, desde 1995 exposto no Museu d'
Orsay. Eram cerca de quatro dezenas de fotografias organizadas em
conjuntos de imagens que colocam a par flores, plantas e corpos de
mulher, segundo disse Ana Ruivo no Expresso/Actual de 28 de Agosto
("Herbário feminino").
A 4ª exposição em perto de cinco décadas
de fotografias está aí. Para se recuperar o tempo perdido. Os negativos
perderam-se, as provas são em geral únicas e marcadas pelo tempo. Estão
vivas.
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Exposições individuais:
"25 Esculturas / Fotografias / Desenhos de João Cutileiro", SNBA, 1961
"Memória", Galeria Valentim de Carvalho – Mês da Fotografia, 1993
"Homenagem a Gustave Courbet", Casa das Artes,Tavira, 2004
Publicações
José Cutileiro, A Portuguese Rural Society (Oxford, Clarendon Press), 1971 – também com fotografias de Gérard Castello-Lopes.
"Flores – Esculturas de João Cutileiro – Homenagem a Mapplethorpe", Museu de Évora, 1999.
Luís Amorim de Sousa, Londres e Companhia (Assírio & Alvim), 2004.
Em Foco.
Fotógrafos portugueses do pós-guerra. Obras da Colecção da Fundação
PLMJ (ed. Miguel Amado), ed. Assírio & Alvim, 2005, e Fundação PLMJ
– Museu da Cidade, Lisboa, 2006
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http://www.p4… photography_books
Estas fotografias de corpos não são
esculturas. São corpos de mulheres, tomando o referente fotografado pela
coisa mesma (uma facilidade de linguagem, e é uma virtualidade das
imagens o tomarem a vez das coisas, substituirem-se a elas, suprirem ou
compensarem (em parte) a sua falta; são fotografias de nus (um género
fotográfico com grandes tradições, desde o início e, por exemplo, com
Edward Weston e Bill Brandt ou o famoso Lucien Clergue, mas as minhas
preferências vão para Lee Friedlander (Nudes, Jonathan Cape, London,
1991, por ocasião de uma exposição no MOMA, NY, comissariada por John
Szarkowski) – em Portugal, Fernando Lemos e o Victor Palla descoberto na
P4, o José M. Rodrigues; e neste caso podemos também vê-las associadas
ao trabalho do escultor, que fez muitos corpos de mulheres em pedra,
etc. É curioso que a um corpo perfeito ou com qualidades (formais) se
chame escultural…
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E agora algumas esculturas: 1969-70, duas
páginas de um catálogo da Galeria 111, Lisboa, Dezembro, 1970. (Fotog.
de J. Santa-Bárbara)

Parte de um texto publicado no catálogo da exp. "Amantes". Agosto 1997, Centro Cultural São Lourenço, Almancil
"As for João Cutileiro, he understands
the human body and draws out from it what is perhaps most moving: the
harmony of its imperfection. All the eroticism of the women hr sculpts
resides in this apparent paradox. Today, a Venus created by Cutileiro
might have a waist too fragile for the volume and weight of her breasts,
frail arms, the shoulders of a young girl, and thighs, compact and
disturbing as mercury. Before these figures of Cutileiro, the pleasure
is truly an erotic one. But it is not the ambiguous and impotent
pleasure of the voyeur. Here the observer leaves himself, transforms,
dissimulating himself as agent and accomplice. Looking at these nudes,
the well known and calming assertion that complete nudity is chaste
loses all sense. These men and women are not undressed to be displayed
in a Greek temple or a modern museum: they are naked for love. Which,
of, course, is the best reason to be without clothes." text José
Saramago (trad. de Glyn Uzzel)
Penso que seria importante que esta discussão se alargasse a outras expressões artísticas.
Um abraço. A discussão e o debate têm que continuar.
Posted by: Carlos Fragateiro | 12/09/2008 at 22:02
Obrigado pela colaboração. Toda a gente manda bocas tipo generalidades políticas (sempre contra), mas sobre questões concretas da agenda faz-se silêncio - um silêncio receoso ou de quem fica à espera duma oportunidade. Então na área da cultura é particularmente evidente a falta de vontade ou coragem de intervir ou a desorientação oportunista.
Mas, quanto ao que propões, haverá de facto um modelo cultural dominante? Ou só uma descosida manta de retalhos sem coerência nem credibilidade, que vai sobrevivendo com as mesmas caras e a mesma falta de decisões, do PS para o PSD e vice-versa?
Será de pensar num (em 1) projecto cultural (unificado, centralizado, estatal) ou de equacionar a pluralidade de dinâmicas, projectos, produções, gerações, interesses, etc, aprendendo a viver com essa diversidade, analisando-a e estimulando-a mesmo?
Porquê pensar a cultura (e em geral é em arte que se pensa) como o centro, em vez de tentar dialogar com credibilidade com outros centros (a educação, a ciência), o que agora quase não acontece?
Porquê pensar Portugal como plataforma (com maíuscula) de encontros, como se alguma coisa passasse por aqui (há apenas turistas, de facto), como se não fôssemos só uma franja, uma periferia - e ganharíamos em tomar consciência dessa posição de distância para equacionar as relações com os outros descentramentos do presente. Depois do tempo perdido, temos de ir à procura, apontar a outros eixos, criar antenas e relações lá fora.
Posted by: Alexandre Pomar
"a segregação dos artistas africanos, das diásporas e das imigrações num elegante ghetto lisboeta"
A Segregação dos artistas africanos, das diásporas, das imigrações e descendentes já existe dê-me exemplos de artistas destes (com nacionalidade portuguesa) que representem ou tenham sido selecionados para representar Portugal ou que tenham apoios do Ministério da Cultura.
Melhor sermos segregados num elegante ghetto lisboeta do que continuarem a fingir que não existimos.
Posted by: Portugal- a negação de algumas existências | 08/06/2009