sábado, 23 de setembro de 2006

1994, 2006, Sommer Ribeiro

 Sommer Ribeiro, a Gulbenkian, o CAM

...a propósito da exposição "50 Anos de Arte Portuguesa" e dos 50 anos da Gulbenkian... porque faltam alguns dados para se fazer a história.

1 . Em 28/05/94 referi no Expresso  a saída por reforma do arq. José Sommer Ribeiro do Centro de Arte Moderna, que dirigira desde o início (1983):
"CAM: passagem de testemunho"

2 . e a 23/09/2006 publiquei uma brevíssima notícia necrológica

Sommer Ribeiro (1924-2006)

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Também se pode ver, no Diário de Notícias de 20 de Julho de 1981, em página inteira, n.n. ("Reportagem"):

"No 25º aniversário da Fundação
SEGUNDO MUSEU GULBENKIAN É DEDICADO À ARTE MODERNA"

publicado na véspera da inauguração da exposição "Antevisão do Centro de Arte Moderna", com base numa entrevista com Sommer Ribeiro, defenindo-se aí o respectivo programa e recordando-se as vicissitudes que conheceu o seu projecto.

1 .

Image2

2. Sommer Ribeiro (1924-2006)
23-09-2006

"Director e administrador da Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva, desde a sua inauguração em 1994, José Sommer Ribeiro faleceu no dia 16, em Lisboa, vítima de cancro. Foi também o primeiro director do Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian (FG), entre 1983 e 94, e em ambos os casos esteve desde o início associado à definição dos respectivos projectos e à sua instalação. Anteriormente, dirigira o Serviço de Exposições e Museografia da FG, criado em 1969, mas a ligação a esta instituição iniciara-se logo no ano da sua criação, em 1956, ao participar na equipa que lançou os primeiros estudos relativos à construção da futura sede.
Nascido a 26 de Junho de 1924, em Lisboa, José Aleixo da França Sommer Ribeiro, que se formara em arquitectura em 1951, teve um papel decisivo na renovação e abertura do panorama artístico nacional ao longo de várias décadas, com independência face às diversas tendências e gerações. Na Fundação Gulbenkian, sobre a qual gostava de dizer que entrara como soldado raso e saíra como coronel, contou com uma relação pessoal de grande confiança da parte de Azeredo Perdigão, o que lhe foi permitindo lançar sucessivos projectos na área das artes plásticas.
Para além da organização de centenas de exposições, e em especial de numerosas retrospectivas, teve uma participação muito influente na aquisição pela Gulbenkian do acervo de Amadeo de Souza-Cardoso e de parte significativa da colecção de Jorge de Brito, bem como na criação da Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva."

sexta-feira, 18 de agosto de 2006

2003, 2006, Jorge de Brito

 Jorge de Brito, a colecção e a Gulbenkian

sábado, 20 de maio de 2006

Brasil, 2006, «Artistas Viajantes e o Brasil no Século XIX»

 Pintores viajantes

À descoberta do Brasil no século XIX 


20-05-2006, Expresso


 

FOTOS COLECÇÃO BRASILIANA / FUNDAÇÃO ESTUDAR

 


Panorama do Rio de Janeiro, da autoria do diplomata belga Benjamin Mary, de c. 1835 (30 x 312 cm, pormenor)

 


O Brasil colonial queria-se um segredo bem guardado. Foi sob o domínio holandês (1630-54) que os pintores Frans Post e Albert Eckhout deram a conhecer à Europa as paisagens do Nordeste e, o segundo, a flora e a população, acompanhando as expedições científicas do governador-capitão Johan Maurits van Nassau. Um quadro de Post (Olinda) expõe-se na Colecção Rau.


A reconquista significou o regresso do «black-out», até a família real chegar de Lisboa, em 1808, fugindo às tropas de Napoleão. Nesse ano abriram-se os portos aos estrangeiros e revogou-se a proibição das manufacturas. Vieram depois as missões diplomáticas, comerciais e também artísticas e científicas, ficando na história a Missão Francesa de 1816, já com pintores que eram exilados bonapartistas. Com a proclamação do Reino Unido e da independência (1822), a difusão das imagens da corte, da capital e da vastidão do Brasil tornava-se parte do processo de afirmação da sua identidade nacional.


A nova política iconográfica, em que se associavam sem fronteiras reconhecíveis a descrição topográfica e a arte da paisagem, a exploração naturalista e a atracção pelo exótico, era favorecida pela chegada de mais pintores viajantes, pela curiosidade científica do século XIX e o gosto romântico pelo pitoresco ou o sublime dos lugares distantes, além de poder contar com o êxito da litografia, que atingira níveis de produção industrial antes da descoberta da fotografia. São as fascinantes imagens desse novo mundo que chegaram ao Palácio da Ajuda (e já antes estiveram no Museu Soares dos Reis), no regresso do ano do Brasil em França.


 



«Natureza-morta com Flores», de Agostinho José da Motta, 1873

 

No Museu da Vida Romântica de Paris exibiram-se com um catálogo que por cá não se editou, sob o título «Os Pintores Viajantes Românticos no Brasil (1820-1870)». Quase tudo o que se expõe, aliás, tem origem na Colecção Brasiliana dum grande antiquário parisiense, Jacques Kugel, que foi casado com a poetisa Merícia de Lemos e durante a II Guerra viveu em Portugal. É um acervo de excepcional qualidade, até há pouco tempo desconhecido, agora pertencente à Fundação Estudar e confiado à Pinacoteca do Estado de São Paulo.


Abrem a mostra os retratos da família real, reunidos a outros do Palácio de Queluz, e estampas da sagração de Pedro I e da aclamação de Pedro II, da autoria de Jean-Baptiste Debret (parente e seguidor modesto de David, professor de influência neoclássica no Brasil). Destacam-se a Marquesa de Belas por Nicolas-Antoine Toney, outro pintor da Missão Francesa, e a imperatriz Tereza Cristina por F.-A. Biard, já de 1858.


Mais surpreendente é a secção «O Registo dos Viajantes», aberta pelo panorama do Rio de Janeiro de Benjamin Mary, onde os estudos da vegetação em primeiro plano se sobrepõem à paisagem desenhada ao longo de mais de três metros. Seguem-se as vistas desenhadas por Karl von Planitz (c. 1840) num preto e branco muito fotográfico, em aguada de tinta da China, enquanto as gravuras a água-tinta aguarelada dum álbum de Johann Jacob Steinmann, editado em Basileia em 1839, antecipam em absoluto o bilhete postal colorido. Depois de mais panoramas de Henry Chamberlain, tenente da marinha britânica e artista amador, as gravuras em água-forte e buril feitas a partir dos desenhos do alemão Thomas Ender, ou as litografias do livro de viagem de Johann Moritz Rugendas (seguidor de Humbolt, desenhador documentalista romântico) são outros exemplos maiores da arte da descrição de lugares, enquanto as cópias das aguarelas do arquitecto militar português Joaquim Cândido Guillobel fazem o registo de tipos urbanos brasileiros, em especial de figuras de escravos.


O último núcleo é dedicado à pintura da paisagem, que já se antecipava num soberbo nascer do sol sobre a baía do Rio pintado pelo italiano Alessandro Ciccarelli (1844) em fulgurantes tons de laranja e ouro. O anterior registo «parafotográfico» dos álbuns de gravuras dá lugar às mais amplas visões embelezadas pela imaginação e o gosto românticos, nomeadamente na representação de negros e índios. É o caso da importante tela de François-Auguste Biard, Índios da Amazónia Adorando o Deus-Sol (c. 1860), que supostamente os surpreende numa floresta densa e misteriosa. Biard viajara pelo Egipto, Síria e Lapónia, possuindo o Louvre uma sublime aurora boreal em Magdalena Bay, exposta no Salon de 1941, à altura de um Friedrich ou dos grandes paisagistas norte-americanos da Escola de Hudson.


Outros viajantes, como o inglês Charles Landseer, o italiano Nicolau Facchinetti, multiplicam as vistas do interior do Brasil, e dois brasileiros têm presenças importantes: vejam-se a Grande Cascata da Tijuca, de Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806-1879), já formado na Academia Imperial de influência francesa (que aprofundou em Paris, onde conheceu e retratou Garrett); e duas luxuriantes naturezas-mortas de Agostinho José da Motta (1824-1878), que actualizam em vernáculo o exemplo barroco de Albert Eckhout.


«Artistas Viajantes e o Brasil no Século XIX» 

 

Galeria de Pintura do Rei D. Luís, Palácio da Ajuda, até 16 de Julho

 


sábado, 1 de abril de 2006

2006, 1956-2006, Gulbenkian

 Gulbenkian 1956-2006

Fundação Gulbenkian, na comemoração dos 50 anos

"Os primeiros anos"

Expresso/Actual de 01-04-2006

O tempo da inauguração da Sede é já o do marcelismo. Os inícios da Fundação datam de meados da pesada década de 50. Salazar aprovou-a num decreto onde frisa que Calouste Sarkis Gulbenkian escolheu Portugal porque apreciava «a tranquilidade que entre nós se desfruta e estimava o que há de estável nas instituições e no equilíbrio social». O recado era claro. Na administração, o liberal Azeredo Perdigão tinha à sua volta vários dignitários do regime (Pedro Teotónio Pereira, Francisco Leite Pinto, etc.). Mas é entre 1956 e 69 que se constrói a imagem mítica da FG como um estado dentro do Estado.

Logo em 1957 abre a 1ª Exposição de Artes Plásticas da FG, na SNBA, com polémicas públicas entre tradicionalistas e modernos. A 2ª fez-se em 61, na FIL, mais pacificamente, e ficou sem continuidade. Também em 57 inauguravam-se os Festivais Gulbenkian de Música, descentralizados e repetidos anualmente até 1970. Mais discretamente, a atribuição de bolsas para graduações no estrangeiro começara logo em 56, e abrem-se os primeiros concursos anuais em 58, abrangendo as ciências, as letras e as artes. O país não era exactamente um deserto (as dinâmicas associativas tinham então grande importância, sem paralelo num presente em que quase tudo depende do Estado e do mercado), mas abria-se um outro espaço público, semi-oficial, à margem do regime e do seu Secretariado Nacional de Informação (o SNI). Improvisava-se uma espécie de Ministério da Cultura alternativo ao que ainda não existia.

Também em 57 tem início o projecto do «Corpus da Azulejaria em Portugal», de Santos Simões, a que se seguiriam os inventários da Talha, da Pintura Maneirista, dos Solares. Lança-se no mesmo ano a construção do Instituto Calouste Gulbenkian do Laboratório Nacional de Engenharia Civil e também o projecto do Planetário em Belém. Muitos outros laboratórios, centros de investigação, serviços hospitalares vão depois receber subsídios para equipamentos e edifícios. Apoiam-se restauros de igrejas, museus regionais, cine-teatros, asilos, residências para estudantes, etc.

Distribuída por Paris, Washington e Londres, a colecção do Fundador é trazida para Lisboa entre 58 e 60, ao cabo de difíceis trâmites jurídicos. Apresenta-se em Paris, Lisboa e Porto, entre 60 e 64, até se instalar no Palácio Pombal em Oeiras, em 65, onde as inundações de 67 farão estragos. Em 58 arranca o Serviço de Bibliotecas Itinerantes, com as primeiras 15. E também o Centro de Estudos de Economia Agrária, seguido em 61 pelo Instituto Gulbenkian de Ciência.

A revista «Colóquio» começa em 59, sob a direcção de Reynaldo dos Santos e Hernâni Cidade. Em 60 abre a Casa de Portugal na Cidade Universitária de Paris (o Centro Cultural de Paris em 65). Em 61 apresenta-se a «Arte Britânica do Século XX», na SNBA, e inicia-se a itinerância pelos Açores e Madeira, depois pelo continente, de mostras de Arte Portuguesa Contemporânea, o que dá lugar a algumas aquisições de obras. Em 65, «Um Século de Pintura Francesa», na FIL, acolheu 100 mil visitantes.

Em 62 tinha arrancado a Orquestra, à partida apenas uma formação de câmara de 13 elementos; o Coro surge em 64; o Grupo Gulbenkian de Bailado em 65, a partir de um anterior Grupo Experimental de Ballet. Entre 62 e 65 atribuem-se Prémios de Crítica de Arte. Em 64 decorre o 1º Ciclo Gulbenkian de Teatro, em 33 localidades; o 2º é só em 71, o 3º e último em 72, mas lembram-se as digressões do Piraikon Theatron em 63 e 68, do Piccolo Teatro de Milão e do Nô japonês em 67. Pelo caminho, tinha-se subsidiado o Teatro Experimental do Porto e o Teatro Moderno de Lisboa (o apoio ao cinema e as grandes retrospectivas são já dos anos 70).

Viriam a conhecer-se em 1975 balanços muito críticos do passado da Fundação, quando, por momentos, pairou a ameaça da estatização. Houve compromissos com o regime e contornaram-se algumas das suas proibições. Entre a prudência e o risco, sob o comando pessoal, por vezes autocrático, de Azeredo Perdigão, a FG ajudara o país a mudar.