quinta-feira, 16 de outubro de 2025

CCB 2025, regresso a "Uma deriva atlântica. As artes do século XX a partir da Coleção Berardo". Guttuso


O Museu Berardo/MAC-CCB está a envelhecer rapidamente. As aquisições pararam (não sei se o comendador tem comprado para o seu futuro museu - em Azeitão?, espero que sim.) E as obras compradas pelo 1º director do Museu, Jean-François Chougnet, nos primeiros anos, pagas a meia pelo estado e o comendador, foram recompradas poir este ao preço antigo. 

Não são as exposições temporárias de arte contemporânea (AC) que o animam, depois das inaugurações friendly. O MAC do nome é mais Arte Moderna, e começar uma montagem das galerias pelos inícios do século XX (“É preciso ser cubista?” e ”Construções”) abre um percurso pouco estimulante, fatigante, escolar. Abundam os papéis geométricos e falta o principal do séc XX: os Nabis Bonnard, Vuillard e Vallotton; os Fauves, Matisse etc; os expressionistas alemães que eram já muito mais caros quando Capelo e Berardo começaram a comprar. A coisa fica desfalcada e árida, em favor de uma abordagem académica pelos "estilos colectivos" que queriam ser a vanguarda e combater a “pintura burguesa” (Francisco Capelo quis documentar numa enciclopédia a suposta evolução escola a escola e isso continua a ver-se na montagem de baixo, antes e depois do “Circa’68”, do Pobre e Conceptual e Minimalista à maneira do Pedro Lapa e do Delfim Sardo).

Como resolver o impasse e o envelhecimento desse itinerário escolar pela Arte Moderna e agora já não Contemporânea? A hipótese indicada abaixo é a de começar pelo meio, pela animação optimista do 2º Pos-Guerra e criar dois percursos, um vindo até ao presente e outro da frente para trás de interesse, documental. 

Abrir um circuito expositivo com 60-peças-60 (refotografias, antigas fotografias copiadas) que não são para ver, porque o que importa é só o título e o conceito explicado na tabela junta, resulta num convite à indiferença e ao cansaço. É o enunciado seco de uma estratégia que já não é dos dias de hoje. A arte não tem de ser chata, autista, virada para dentro ou vazia.

Note-se que aquilo só podia ser uma aquisição do Estado (Coleção de Arte Contemporânea do Estado) e Coleção Ellipse: foi a meias com o Rendeiro? foi compra conjunta? - a promiscuidade era conhecida, via Pedro Lapa (Chiado) e Alexandre Melo (Gabinete Sócrates). Faz muita falta indicar a data das aquisições e até a galeria que vendeu.



A exposição tem um início "difícil" (árido) com as secções É PRECISO SER CUBISTA? (não, os expressionistas iam por outros lados, os italianos também, mas a colecção falha aí, os expressionistas dos anos 1900/20 eram muito mais caros que os papéis geométricos) e CONSTRUÇÕES ("a ênfase experimental") - apesar do sucesso da sala Lourdes Castro com a mala de Duchamp (mas não é "a vertigem da reprodução técnica" que guiava a artista, era o desenho, a observação e o desenho do contorno).
Continua o percurso com ABSTRAÇÕES DISSONANTES e o foco nas "propostas radicais de abstracção" e nas teorias. O SURREALISMO é um extenso cortejo de obras maiores e menores, ilustrativas das receitas do estilio (a col. Berardo conta com muitas obras menores que não são de rejeitar), no entanto mantém-se a ideia aqui questionável de "vanguarda" e sublinha-se o momento "fortemente politizado à esquerda e "ao serviço da revolução" de Breton, o que não se comprova... A Academia curaturial quer ser revolucionária - é um tique falsamente adolescente.
De facto a exposição "Uma deriva atlântica. As artes do século XX a partir da Coleção Berardo" devia começar na área levianamente chamada AINDA A PINTURA (o 2º Pós-Guerra, que nos é ainda próximo, na sua diversidade figurativa e abstraccionista e com trânsitos intercontinentais, a tal "deriva" do título) e deveria ir continuando até ao presente com NOVOS REALISMO (? sic) E POP, e abrindo-se às boas figurações da colecção que aqui não se mostram por não caberem no restrito propósito teórico das responsáveis -, incluindo o espaço REVOLUÇÕES para encontrar temas actuais da "politização da arte".
Começando então nos anos 40/50, anos fortes de reconstrução e inquietação "Postwar" (Enwezor, Munique 2016), o percurso avançaria com interesse até ao presente, enquanto outra direcção contrária voltaria para trás até ao início do século XX, por origens e revivalismos, numa perspectiva hoje escolar - regressiva-progressista. Nesse retrocesso cronológico e temático caberiam GEOMETRIA ÓPTICA e VOLTAR AO ZERO, mais as suas supostas vanguardas e purismos em que o zero é insignificância e formalismo. E também os PAPEIS cuja escolha procura favorecer a "desmaterialização" e a experimentação conceptual: mais do mesmo, regressos, extermínios.
É uma exposição que volta a mostrar a riqueza da colecção Berardo, mas muito marcada por concepções académicas que se querem encostadas a serôdios futuros.



Renato Guttuso (1912-1987): Studio e Paesaggio / Atelier e Paisagem, 1960, 200x320cm. Col. Berardo. Uma das mais poderosas obras do Museu Berardo/CCB.

É também auto-retrato (em cima à esquerda) e natureza-morta, interior e exterior, pintura e colagem, reflexão sobre a pintura e o trabalho do pintor.

Guttuso foi um artista comunista independente, amigo de Picasso e Pignon, num trio avesso à disciplina do realismo socialista, 

influente entre os realistas britânicos dos anos 1950 (Peter Berger; kitchen-sink-painters ; ver the Estorick Collection of Modern Italian Art|:  renato-guttuso-exhibition-at-the-estorick-collection-london/ , 2015. 


Com um museu na terra natal Bagheria ao lado de Palermo  que fomos visitar em 2003: museoguttuso.com/museo/ : "Dal Fronte Nuovo all'Autobiogrfia 1946/1966"



GUTTUSO E GERMAINE RICHIER (LOUVA-A-DEUS, GRANDE 1946-51)


FRANCIS GRUBER, NU NUMA CADEIRA VERDE, 1944


JEAN HÉLION, OS PÃES, 1951



Mário Dionísio, O Músico, 1948 (antiga Col. Júlio Pomar / Maeria Berta Gomes >... Col. Berardo) 

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At the Estorick exhibition, the room ‘Corrente and the Art of the War Years’ shows the period of Guttuso involved in the group Corrente. The members came together around a magazine with the same name founded in Milan in 1938. The Corrente group referred to the Scapigliati, which literally means ‘dishevelled’ or ‘unkempt’ – an Italian bohemian movement born in the 1860s. Corrente opposed to the official culture of the regime, refusing the cultural isolationism of the Fascism. The importance of Corrente is to have laid the foundation of the Realism movement, which was to dominate the Italian cultural panorama in the post war.

In the 1940 Guttuso became a member of the clandestine PCI (Communist Italian Party). Many of his works were

Heroine (Garibaldean Heroine / Assassinated Partisan), 1954, Co. Galleria d’Arte Maggiore, Bologna © Estorick Collection, London

Heroine (Garibaldean Heroine / Assassinated Partisan), 1954, Co. Galleria d’Arte Maggiore, Bologna © Estorick Collection, London

commercialised in the clandestine market, because the thematic were anti – Nazis and anti- fascist, but also anti – clericalist. However, he continued to participate and winning prizes in exhibitions supported by the government. During the Second World War years, next to members of the Communist Party, Guttuso actively participated in the Resistance.

The room ‘The Post-war period’ shows that in the late 1940s and the following years, Guttuso was one of the most significant artists, who also shaped a style ruling Italian culture. Determinedly popular, his imagery continued to chronicle Italy’s frequently turbulent political life and the changing of its society for over 40 years. The Realism found favour in the PCI (Italian Communist Party).

In 1947 Guttuso joined the Fronte Nuovo delle Arti a movement polemic against the formalist tendencies of many abstract artists, from which he split later.

Strongly confident about his beliefs that art should be ‘useful’, Guttuso continued to use his vigorous and accessible style to socio-political themes over the course of his career.

During his life, Guttuso loyally remained a member of the PCI, the Italian Communist Party, for which he even realised the emblem used until the dissolution of the party in 1991. He was also elected twice (1976 and 1979) member of the Parliament in the Senato chamber.

In the Post-war period, Guttuso was internationally recognised as artist and politician. In 1950, he received the Peace Prize by the World Peace Council. A number of monographic exhibitions were organised outside of Italy, including London (1950 and 1955), New York (1958), Paris (1971) and Moscow (1961).

Neighbourhood Rally, 1975, Courtesy Galleria d’Arte Maggiore, Bologna © Estorick Collection, London

Neighbourhood Rally, 1975, Courtesy Galleria d’Arte Maggiore, Bologna © Estorick Collection, London

At the Estorick exhibition, a special area is dedicated to ‘Guttuso in Britain’. In the years following the war, he was very well considered in the British art world. He found a strong support in the Marxist critic, John Berger, and friendship with Roland Penrose and Kenneth Clark, and of course Eric Estorick. A number of letters and documents on display at ‘Renato Guttuso: Painter of Modern Life’ show these relationships he had.

The third room upstairs, ‘A friendship across Europe: Renato Guttuso and Peter de Francia’ is focused on the relationship between the two artists, who met in Italy during the post war. The British artist De Francia (1921 – 2012) was born and brought up in France, and lived in Italy for a while. He was painter, teacher and writer. He exhibited widely in Milan, London, New York and Delhi. He was teaching in the Royal College of Art. His works are currently on display at the Tate, V&A Museum, MoMA, and the British Museum. Guttuso wrote and introduction to De Francia exhibition in New York (1962).

Guttuso died in Rome, on 18th January 1987. Before his death, it seems he was reconnecting to the Roman Catholic religion. He now rests in his hometown Bagheria, at the Villa Cattolica, where a museum dedicated to him and his work has been established.


quarta-feira, 15 de outubro de 2025

1997 João Cutileiro: "Um lugar na cidade", uma fonte, um anti-monumento, o 25 de Abril no Parque Eduardo VII

"Um lugar na cidade"  


3-V-1997 Expresso Cartaz 


JOÃO CUTILEIRO prepava-se há perto de 40 anos para fazer uma estátua equestre — uma pequena maquete em bronze, de 1962, pensada precisamente para aquele lugar foi mostrada em Lagos, quando, a propósito dos 20 anos do D. Sebastião (1973-1993), se puderam rever os seus projectos de esculturas para espaços públicos. Agora, porém, optou por destruir o plinto que existia no cimo do Parque Eduardo VII, para onde se chegaram a prever, no regime anterior, as figuras de Nuno Álvares Pereira ou D. João I. O cavaleiro que alguém terá ainda de encomendar ao escultor irá para outro lado. 

Ali, no exacto enfiamento do Marquês de Pombal e do obelisco do Rossio, sobre o panorama da cidade e do Tejo, que é também um lugar fisicamente marcado pela monumentalidade do regime anterior (nas colunas de directa referência nazi <quando muito fascista, mas é mais romana e imperial> e, através desta, de invocação de uma mitificada ordem clássica — recorde-se, por exemplo, o projecto de Albert Speer para as portas de Salzburgo, de 37, incluindo um plinto-altar vazio), Cutileiro instalou uma fonte que é, ao mesmo tempo, monumento evocativo e anti-monumento. Não se tratava de substituir os emblemas de um regime pelos de outro, mudando apenas de sinal um acto de celebração do poder (questão ideológica e ético-artística essencial), mas de evocar o 25 de Abril no seu sentido mais decisivo de deposição de uma ditadura e de início de um projecto de democracia que será «o que nós quisermos», como diz o escultor. 

Como diz Cutileiro, o 25 de Abril, data histórica, «é anti-monumental por definição», no acto do derrubar um regime imóvel e autoritário (como um monumento) e de recolocar um destino colectivo nas mãos de um povo. E a sua intervenção de escultor também não quis ser um monumento no sentido tradicional de consagração de um momento congelado no tempo e de sacralização da distância entre os símbolos de um poder, divino ou heróico, e o espaço comum da cidade. A sua «Evocação do 25 de Abril», título presente na necessária lápide inaugural, é uma fonte, tipologia construtiva em que, neste caso, se põe em evidência quer o significado da permanente agitação da água em movimento quer a ideia de que «a fonte é a origem» (J.C.).




A abordagem dos emblemas formais e dos seus sentidos — a fonte e o cravo, o derrubar de uma forma prévia autoritária, a ideia de inacabamento de um processo sempre em construção, a recusa de uma «mensagem» escrita (mas estão lá as marcas de trabalho trazidas da pedreira), a instalibilidade da água, a forma fálica presente em qualquer obelisco ou coluna, mas que aqui remete para a configuração dos megalitos alentejanos — seria inesgotável e prolonga-se com absoluta coerência no equacionar da problemática da escala. A opção do escultor foi a de contrapor uma dimensão humana ao gigantismo autoritário das colunas pré-existentes, transformando um lugar votado à representação do poder (com maiúscula, tal de usa em algumas concepções da arte) num espaço de uso público, de lazer e de prazer: os degraus que limitam um dos lados do lago são um convite directo a mergulhar os pés na frescura da água corrente; o arranjo do espaço envolvente é propício à permanência, inventando uma praça num lugar previlegiado da cidade mais ainda inóspito. Às memória romanas que as colunas transportam, com sentido imperial, contrapõe-se a lembrança das fontes de Roma, despidas das suas mitologias de Neptunos e criaturas marinhas, que também não teriam lugar na evocação do 25 de Abril.

A intervenção de João Cutileiro, com o sentido político da sua reflexão sobre a data e sobre ideia de monumento, com a ironia inerente a uma modernidade que já não quer ser construtora de mitos (ao contrário dos modernismos vanguardistas), exercida na inteligência das formas e também dos seus sentidos, está, como sempre, à beira do escândalo. Como o seu D. Sebastião de Lagos, estátua de menino e equívoco herói nacional, a fonte-evocação do 25 de Abril é um monumento controverso. O que significa, se for necessário dizê-lo, que o escultor não se limita a gerir a sua própria consagração, que a sua obra continua a ser inventiva e problemática.

Vale a pena, por isso, considerar uma primeira explicitação pública das resistências com que a obra de Cutileiro se enfrenta, já expressas num texto de Rúben de Carvalho («Capital, 29 de Abril) — mas sem de modo algum pôr em dúvida o seu «direito a dar opinião», por falta de uma qualquer especialização. O que importa é ver como é decisiva a questão da escala na procura de uma monumentalidade que, sob a aparência de um problema de dimensões, tem a ver com significados, concepções de poder e autoridade, com ideologias. 

«O problema do monumento ao 25 de Abril é que não tem o tamanho, a envergadura, a proporção, o significado do sítio onde está», diz R.C. Duas afirmações anteriores valem como sintomas de uma recusa mais profunda: por um lado, considera que as duas colunas (talvez por efeito de uma contradição entre a encomenda fascista e a autoria democrática de Keil do Amaral, a qual seria essencialmente decisiva, embora sem tradução formal) «têm equilíbrio, proporção, dignidade, coerência, ao nosso lado acompanham na sua altura os quilómetros de vista...». Esses atributos são as de uma ordem que é a da autoridade e não a da vida, são pretensas marcas de um poder que se afirma na arrogância da altura. Noutro passo, atribui ao D. Sebastião, apesar da sua pequena escala, «o fascínio e a grandeza de um monumento» — é a recusa a entender a mesma condição de anti-monumento com que Cutileiro soube sublinhar o sentido mais radical da sua última obra.     


Nota: foi uma batalha acesa, com vários participantes aguerridos, moralistas uns (o pirilau), conservadores outros (a escala, o Rúben...)

 

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

1951-52 Júlio Pomar Gravuras: a campanha pela paz e as cenas de trabalho, 1954

Júlio Pomar e a politização da arte" (parte III)

À gravura (seis linogravuras e litografias de 1951) cabe um papel essencial no segundo período militante de Júlio Pomar, ao tempo da campanha do PCP contra a NATO, em especial contra a reunião do Conselho da Europa em Lisboa, no IST, em 1951, a seguir à adesão de Portugal à OTAN/NATO em 49, e em defesa da paz no espaço da propaganda política alinhada com Moscovo, no contexto da Guerra Fria.

Convém vê-las em conjunto (o que também não ocorre na actual exposição, aliás, com os dois quadros representativos desse tempo) para ter a dimensão do que foi o envolvimento político do artista, comprovado pelas edições de autor com maiores formatos e tiragens, que passam dos 30 ou 45 exemplares confidenciais para os 150 ou 200 exemplares com distribuição partidária. Esta era assegurada no Porto pela cooperativa SEN, Sociedade Editora Norte (1942-1959). A cooperativa Gravura ainda estava longe (1956). 

A bomba, 1951


Mulheres fugindo ou A Explosão 1951 (nº 9 - Nota 1), (tb conhecida como A Bomba Atómica)
As Mães 1951 (nº 8.)
Linogravuras. 34,4x44cm / papel: 39,7x51. Edições do autor. Tiragem 150 exemplares. Impressas na Tipografia Garcia e Carvalho, Lisboa
Ambas são referidas nos catálogos da II Bienal de São Paulo, representação portuguesa 1953, e certamente expostas.


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e a pomba da paz, 1951 (litografias não expostas)
 


Menina e Pombas 2º estado (nº 11), 54,5x38,5 / 65x48,5cm 200 ex.#
Duas meninas com Pomba (nº 12) 32,5x23,5cm, tiragem desconhecida
A Refeição do Menino (nº 13), l50x65cm, Atelier Amândio Silva, Porto, 200 ex. #
(# incluidas nos catálogos, geral e nacional, da representação enviada à II Bienal de São Paulo, 1953)

Menina e Pombas 1º estado (nº 10), 54,5x38,5 / 65x48,5. 45 ex. Exp. SNBA 1951


recorte do Boletim SEN nº 4 Novembro 1951, com várias incorrecções


"As novas urgências da intervenção partidária afirmaram-se com clareza numa série de gravuras dedicadas ao tema da Paz, que tiveram grande difusão e marcaram presença nas casas de todos os intelectuais de feição comunista, distribuídas pela SEN (Sociedade Editora Norte, Porto), pouco depois encerrada. Às linogravuras As Mães e Mulheres Fugindo, que também se chamou A Explosão e foi conhecida como A Bomba Atómica, seguem-se no mesmo ano de 1951 as litografias em que figura a pomba proposta no cartaz de Picasso para o Primeiro Congresso Mundial dos Partidários da Paz de Paris, em 1949, como emblema da causa, com referência à filha Paloma: três versões de meninas com pombas e <uma variação> do Almoço do Trolha na versão A Refeição do Menino (ou com título Família). As quatro gravuras foram enviadas à alargada mostra de São Paulo <II Bienal, participação do SNI>." in A. Pomar, ed. Guerra e paz / Atelier-Museu 2023, p. 139


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1952-1954

São já obras de diferentes características as gravuras seguintes. A 1ª está associada ao quadro com o mesmo título de 1951, as segundas integram o Ciclo "Arroz", a par de várias pinturas e desenhos. É já a observação directa (ou fotográfica) das figuras e do trabalho do povo, que continuará a caracterizar a produção dos seguintes anos 1950 e 60, mesmo depois de deixar o neo-realismo.


Nazaré 1952 e Vila Franca (Arroz) 1954
Arroz, nºs 21 e 22, também 23


Nota 1. Os números indicados reportam-se ao volume Julio Pomar, Obra Gráfica, Mariana Pinto dos Santos coord e Alexandre Pomar catalogação, ed. Caleidoscópio 2015


Fotografias do acervo documental



As fotos da Nazaré são de autor desconhecido
As das lezírias igualmente, ou de Cipriano Dourado. Ver Os Ciclos do Arroz, ed. Museu do Neo-realismo, 2016


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ADENDA


Boletim Nº 4
Segundo uma anotação manuscrita teria sido já antes sorteado entre os visitantes da 
Exposição da Primavera de 1946, no Porto... 

A SEN tinha já editado «Refugio Perdido» e «Engrenagem» - obras inéditas de Soeiro Pereira Gomes (1909 - 1949, na clandestinidade desde 1945, autor de « Esteiros», 1941), e distribuia então as edições em fascículos de "Mulheres do meu País" de Maria Lamas, Ed. Actualis, "História da Cultura em Portugal" de António José Saraiva, Jornal do Foro, e "História da Arte" de Elie Faure, Estúdios Cor, que ficaram na biblioteca familiar.

Para as edições da SEN JP colaborou com uma ilustração, desenho de 1947, Caxias, para o conto «Week End» de José Cardoso Pires, no nº 1 de "Meridianos de Arte e Cultura" (pág. 139).

quinta-feira, 9 de outubro de 2025

1951 1954. Júlio Pomar e a "politização da arte" (parte II). O 2º tempo miltante, A Guerra Fria

 2º PERÍODO MILITANTE, 1951-1954

OS CARPINTEIROS* 1953 nº 100, 144x112cm. Exposto na 7ª EGAP.  Col. Sociedade Portuguesa de Escritores (1956-1965) > Associação... após o seu encerramento. A bicicleta era muito usada pelos funcionários clandestinos do PCP por razões de segurança - pode ser essa a "razão" do quadro, depois da bicicleta ter surgido noutra obra de 1950 com um casal de namorados (Na estrada de Aveiro, 1950 nº 66).


MULHERES NA LOTA (NAZARÉ)* 1951 nº 74, 74x121cm aglom. Exp. XLVIII Salão da Primavera SNBA. Col. Alice Jorge > ... AMJP. Uma fotografia que ficou no acervo documental registava esta cena, e uma linogravura de 1952 usou parte desta composição.

Não exposto:

MARCHA 1952 (nº 86) 122x199cm. Col. particular. Reproduzido pela 1ª vez no Cat. Raisonné em 2004; exposto no Atelier-Museu em 2020, em "O rosto impreciso... Retratos de JP". José Dias Coelho esta representado ao centro, entre o jovem casal; à direita o eng. Frederico Pinheiro e a sua mulher, Dina, camarsadas e proprietário do quadro; no bordo direito o escultor Vasco Pereira da Conceição, chefe do atelier da Praça da Alegria, que foi também lugar de tertúlia e ante-câmara da SNBA, então encerrada. Ver o capítulo "Marcha" em A. Pomar, 2023.


Em 1953, num artigo publicado em O Comércio do Porto, JP fazia a revisão (e reorientação) do percurso do neo-realismo e a auto-crítica dos desvios que ocorriam desde 1949:

"Entre aqueles que se afirmavam dentro dos princípios da corrente, alguns perigosos caminhos começaram a desenhar-se. Um lirismo, complacente, tende a substituir a agressividade dramática das primeiras tentativas. A procura de soluções formais começa a sobrepor-se ao vigor de conteúdo; e isto não reflecte senão um alheamento dos problemas realmente vivos. Boa parte do que pintei nos anos de 49 a 51 oferece tais características, e desvios de tipo análogo marcam a obra plástica de Mário Dionísio. 

Tinham-se aberto «as portas ao maneirismo e ao formalismo e, em último grau, à renúncia dos objectivos abraçados com entusiasmo» 

"As razões desta fragmentação [no seio da corrente ou tendência do ‘realismo social’] devem procurar[-se] na evolução dos acontecimentos da vida portuguesa, no cair das ilusões que uma interpretação apressada das consequências da II Guerra Mundial ajudara a criar."

in «A tendência para um novo realismo entre os novos pintores portugueses», 22 dez 1953, reeditado em Estrada Larga 2, Porto Editora 1959, pp. 40-45 (antologia d'O Comércio do Porto, dir. Costa Barreto); reed. no catálogo Arte em Portugal nos anos 50, 1992, pp. 48-50 (dir. Rui Mário Gonçalves), e em Notas sobre uma arte útil, Atelier-Museu/Documenta 2014, pp. 287-288. Porque foi este o seu último artigo publicado na imprensa, à época, ficou sempre por esclarecer. 

 A mudança envolvia a temática de várias das pinturas posteriores a 1951, numa nova militância política, e partidária, e também o estilo ou linguagem da pintura, que é mais austera (sem a pulsão lírica e decorativa anterior) e de uma figuração mais exacta, numa certa aproximação ao que era o realismo socialista de produção francesa, e tinha, aliás, larga expressão internacional, em especial americana: na exposição "Postwar" de Enwezor, 2016, JP é exposto ao lado de Alice Neel. A par de numerosas obras decorativas de encomenda, incluindo vitrais e baixos-relevos, uma outra linha de produção experimentava livremente  a paisagem sem sentido naturalista, antes com abertura ao imaginário (Barcos, Ericeira 1953- nº 94*) e que há data não foi exposta -, e produziu várias gravuras que se integravam na campanha política pela paz. (ver a seguir)

A antologia de 1986 (itinerante no Brasil e vista no Centro de Arte Moderna) passava directamente de 1951 para 1960. Na anterior retrospectiva (1978 Gulbenkian, Museu Soares dos Reis e Bruxelas) tinham entrado onze obras da década de 40 e só duas da de 50: só Mulheres na Lota (Nazaré)*, que ficara na casa de Lisboa com Alice Jorge, e o Estudo para o Ciclo 'Arroz' II. É um tempo de crise, também pessoal, de escassa produção e em grande parte encomendas decorativas. foi depois um tempo de apagamento de memórias.

É o período das campanhas pela paz que o PCP promovia nos anos 1949-54, no quadro da Guerra Fria e da guerra quente da Coreia. Mobilizavam-se acções de rua e abaixo-assinados de apoio ao Apelo de Estocolmo pela proibição das armas nucleares, aprovado em 1950, e em especial contra a reunião do Conselho do Atlântico, em Fevereiro de 1952 no Instituto Superior Técnico, depois da adesão portuguesa à NATO ter sido ratificada em Julho de 1949 – acontecimento e movimentações que vinham abrir brechas nas dinâmicas da Oposição, antes tendencialmente unitária, separando comunistas e democratas, estes favoráveis ao lado ocidental. 

É também um período de forte repressão policial e censória que decorreu durante e depois das candidaturas presidenciais de Norton de Matos e Ruy Luís Gomes (em 1949 e 1951, respectivamente, quando falhara a candidatura do almirante Quintão Meireles e a de R. L. G. não foi aceite). Naquele ano de 1952 a SNBA foi fechada e interrompeu-se a sequência das Exposições Gerais, por Eduardo Malta ter sido expulso de sócio devido a um conflito público com Dias Coelho. Era também o tempo da polémica interna do neo-realismo, em torno da orientação da Vértice, a que se liga um «desvio sectário» que fracturava os meios intelectuais, com um PC debilitado por muitas prisões. (Depois, com a morte de Stalin e o relatório de Khrushchev, viria o chamado «desvio oportunista de direita», de 1956-59, a seguir outra vez «corrigido» pela fuga de Cunhal de Caxias, em 1961.)


Em 1952 fizera uma declaração de independência, numa publicação francesa em que José-Augusto França o associava ao realismo socialista:

Sem título [ Le sujet n’est pas le contenu» (O assunto não é o conteúdo) ]

«Deformação profissional: não acredito na infalibilidade do Papa. Cada dia, cada minuto, reponho o mundo em questão. O trabalho (métier) de pintor é um trabalho de pesquisas, de descobertas, de invenções: pesquisas, invenções, descobertas que nascem da vida e a ela retornam. Houve um tempo em que desprezei certos assuntos? Erro meu. O assunto não é o conteúdo, é um pretexto, e mais nada. O conteúdo é a síntese dialéctica entre o tema e a experiência pessoal e vivida do artista. Ela manifesta-se na forma, vive nela, é exaltado por ela. Os conteúdos das minhas telas são “as razões que me ajudam a viver”.»

in Premier bilan de l’art actuel 1937-1953 (sous la direction artistique de Robert Lebel), Le Soleil Noir: Positions, Paris. Cahiers Trimestriels, n.º 3 et 4, p. 314


As pinturas políticas:




Esse segundo período, que se situa a partir de Mulheres na Lota (Nazaré) de 1951, recupera a firmeza austera de um realismo social interventivo, seguramente sensível à disciplina estética que chegava de França (era o "nouveau réalisme" de breve curso), mas com liberdade formal. Fez nesse ano a primeira viagem a Paris e aí visitou Pignon, Fougeron e Taslitzky, mas não deixou testemunho do que viu, apenas referência ao facto. Ao tempo Mário Dionísio publicava na Vértice os seus Encontros em Paris, onde dialogava com muita reserva com os dois últimos pintores franceses referidos, e em 1952 deixou o PCP, na sequência do conflito sobre as colaborações de comunistas na revista Ler, das Publicações Europa-América; a seguir condenou a participação portuguesa na 2ª Bienal de São Paulo tutelada pelo SNI, deixou de expor nas Gerais e desligou-se da SNBA. Em face do artigo publicado no "Comércio", cortou logo relações (até 1966). Ver M. Dionísio, "Passageiro Clandestino" Volume I, p. 112: um breve parágrafo em que o refere como "uma das várias serpentes que ingenuamente abriguei no meu seio"

De facto, a reconsideração do movimento neo-realista e a explícita autocrítica presentes no artigo de Pomar publicado em 1953 n’O Comércio do Porto (e não na Vértice como era mais habitual) não seria uma cedência circunstancial à pressão partidária, mas foi muitas vezes como tal interpretada - e por isso depreciada. 


Vejamos a seguir as obras decorativas, as paisagens "íntimas" e imaginárias, por fim as gravuras que participam da militância pela paz.



quarta-feira, 8 de outubro de 2025

1945-48, Júlio Pomar e a "politização da arte" (parte I). Do fim da Guerra até Norton de Matos

Da página "ARTE", 1945, à candidatura frustrada de Norton de Matos


Se procurarmos focar a relação de Júlio Pomar com a política na sua obra (a propósito da exp. "Neorrealismos ou a Politização da Arte em Júlio Pomar" (até 02.11 exposicoes/neorrealismos ), devemos destacar dois tempos distintos, os anos 1945-48 e 1951-54, que se identificam com dois diferentes contextos nacionais. Entre eles existe um intervalo com características próprias: a perda das expectativas de uma queda do regime no imediato pós-guerra, uma situação pessoal que inclui o casamento e o nascimento dos filhos, a que se associará uma vertente lírica que será objecto de autocrítica escrita em 1953, e um maior investimento na profissionalização como pintor, entre a desistência do curso de Belas Artes no Porto, 1947; a expulsão de um lugar de professor, 1949; e a primeira individual de pintura em 1950 e 51.

Antes da afirmação neo-realista, que ocorreu nas páginas do suplemento "Arte" e na Missão Estética de Évora, em 1945, tinham aparecido temas de índole política e social, com incidência da pobreza, desde 1942, na guerra e na prisão, FERROS* de 1944. O que se verá adiante.

O Gadanheiro* (ou Gadanho), nº 29, é a obra emblemática, trazida de Évora e exposta também na SNBA em 1945. As obras então mostradas foram objecto de um primeiro artigo crítico de Mário Dionísio,  influente crítico literário e figura política, publicado na Seara Nova: "O princípio de um grande pintor?". Referia-se aí igualmente à primeira mostra de 1942 no atelier da Rua das Flores e ao itinerário seguinte (ver 1944), e foi determinante na projecção muito rápida da notoriedade do artista.

De regresso ao Porto, três obras exibem uma intenção política que é própria das expectativas do pós-guerra e marcam as colectivas de 1946 e 47: Estrada Nova*, Marcha* e Resistência*. 
Duas outras pinturas de 1947, Parlatório e Bailique, mostram cenas da prisão de Caxias, obviamente não expostas. Parece improvável que fossem pintados na prisão.

JP começara a pintar os frescos do Cinema Batalha, 1946-47, nº 38, terminados após sair da prisão em simultâneo com a 1ª mostra individual, de desenhos, na liv. gal. Portugália. Foram ocultados em 1948, já no contexto repressivo que acompanha a candidatura presidencial de Norton de Matos, do qual (em 47 ou 48?, por iniciativa de Mário Soares) desenhara um retrato que foi muito reproduzido em postal e telões de comícios - é uma lacuna injustificada na exposição. A candidatura estava em marcha em 1947 e a desistência à boca das urnas ocorre em 1949 por pressão do pcp contra as posições moderadas de democratas e socialistas. Fecha-se um ciclo político iniciado com o fim da II Guerra.

O Almoço do Trolha*,  de 1946-50, nº 39, é contemporâneo: tem por origem o que observa no Batalha, foi exposto inacabado na 2ª EGAP e terminado para a individual de 1950 na SNBA. Imediatamente considerado uma obra maior, não vai à individual no Porto, Portugália 1951, e terá sido objecto de uma tentativa de aquisição de Diogo de Macedo para o MNAC (o preço de 10 mil escudos, enorme para a época, fora impresso no catálogo como 1000 escudos - comprou mais tarde Menina com um Galo (Morto), de 1948, através da Gal de Março em 1952).

Três outros quadros, não expostos, FARRAPEIRA, CARVOEIRAS, CARQUEJEIRA fazem parte deste tempo inicial de grande acutilância política. São figuras populares do Porto, mulheres especialmente marcadas por trabalhos muito duros (conhecem-se imagens da rampa do Douro às Fontaínhas que subiam com grandes cargas de carqueija) e as suas figuras rudes e agrestes surgem tratadas com uma áspera densidade matérica.

Estrada Nova* 1946 nº 31 40x57cm, carvao aguarelado papel, 1ª Exp. da Primavera, Porto e 1ª  EGAP. Col? >... AMJP

Marcha* 1946 nº 36, 42x58 carvao aguarelado, 1ª Exp. da Primavera, Porto e 1ª  EGAP. Col. MBGomes > Rosa Pomar

Resistência* 1946 nº 37, 33x73 aglomerado, 2ª EGAP: apreendido. Col. Rui Perdigão, Porto > of. CML

Parlatório* (Caxias) 1947 nº42, 54x88 papel/aglom. exposto em 1978. Col. M Barreira e VPConceição>MNR

* obras expostas no Atelier-Museu
n: numeração do Catálogo Raisonné Vol I

OBRAS NÃO EXPOSTAS

Bailique (Caxias) 1947 nº43, 87x52 papel/aglom. Exp. 1983. Col Joaquim Namorado>PCV

Farrapeira Porto 1947 nº 40, 70x40 agl., 2ª EGAP, Col Jorge A Monteiro, Bombarral >...

Carvoeiras Porto 1947 nº41, 36x54 aglom., 1950-51 Ind. Col. MBGomes > ... Rui Victorino

Carquejeira Porto 1948 nº 45, 48,5x33 aglom. Exp. ? Col. Euclides Vaz > ... Moncada


RETRATO DE NORTON DE MATOS, 1947 ou 1948?

comício com Maria Lamas










domingo, 5 de outubro de 2025

Marlene Dumas on Alice Neel, 2010

 Alice Doesn’t Live Here Anymore

Marlene Dumas on Alice Neel

When Alice Neel started to become better known in America in the early 1970’s, I was an art student in South Africa. By that time, in my existential search for the human face and figure, I knew the work of Bacon and Hockney and looked at the photographs of Diana Arbus and the silk screens of Andy Warhol, but no-one showed me Alice Neel. However, when I did  finally stumble on a reproduction of her work somewhere, it immediately stuck. Strangely, when I got to Holland in the late 70’s, no one there knew about her either.

I never met Alice Neel in person. It was not because she was a woman or had a difficult life that I fell for her. It was not because of her witty writings that I was attracted to her work. I only discovered that to my surprise, much later on.

What struck me as very special, very welcome but truely extraordinary was the fact that not only did she paint ordinary people sitting on ordinary chairs who were actually dressed in the (by now outdated) colorful fashions of their time, but in spite of, or, at the same time, it was also still a modern painting. It was her achievement, that she could paint anxiety in bright (even decorative) colors. My generation was taught that modernism did not like the seasonal changes that were the natural realm of fashion, because art dealt with the universal, the timeless and the eternal. Art should not illustrate or be tied to the likenesses of a specific time and place. That is why, even now, I mostly paint naked people, because I still can’t picture the sublime with a dress on.

Most figurative painters of the late 20th century placed their figures in a sort of nowhere or non-space. Alice always located her subjects. She lived somewhere. People live in a place, share the same space. They are related. There’s been a lot of artistic talk about ‘Identity’ these last 20 years. Critics love the noun, placing the emphasis on the wrong spot. Alice used the verb. She identified. It is about identifying ‘with’: to find the right balance in the power struggle between the artist and subjects. That is the transformative magic of portraiture and Alice painted portraits. She didn’t paint models, she didn’t paint monsters. She painted people.

Most figurative painting is not about people or rather they seldom paint ‘characters’. Guston painted cartoons. Warhol public images, Chuck Close uses portraiture to paint about painting, Katz paints the cool, Peyton paints dreams…

It is interesting to note that in the recently published, Art since 1900: Modernism, Antimodernism, Postmodernism, by Foster, Krauss, Bois and Buchloch, the word ‘portraiture’ does not appear in their elaborate index, neither is there a mention of Katz, Close or Alice Neel for that matter [1]. They do mention somewhere the fact that conceptualists regarded the portrait as a historically obsolete model….  .

Neel is a modernist portrait painter, if you wish. When her paintings are good, they vibrate and tremble with an energy as nervous as Munch. It disturbs and disorientates without making use of extreme expressionisms or surreal proportions or dramatic distortions (coming from the African continent I don’t call her akward perspectives ‘distortions’, it seems quite naturel to me.) It’s a mixture of Picasso and Matisse, maybe stirred not shaken. It is both harsh and sweet. It deals with both love and fear simultanously. She moves fast. I like that the interaction between her and her life models breathes. She does not paint the weight of the waiting. She draws and talks with the paint. She does not treat the painting as an endless hard labour. She treats it as an opportunity to feel free. As she said ‘a way to overcome the alienation’. I feel similar. I admire the work’s unfinished look, the underkill. When it’s over, it’s done.

Alice did not die young. Yes, not everything she painted was a masterpiece. But art is not (only) about masters and pieces. It is also about attitude and courage. The unflattering criticism she received about her nude self-portrait at aged eighty, is unforgivably stupid. She painted the most touching paintings of pregnant women that I have ever seen. And, although not consciously, I think my painting The Painter (1994) is indebted to and paid homage to her portrait of Andy Warhol (1970), one of the most beautiful paintings of our century. 

Andy Warhol 1970     / Marlene Dumas The Painter 1994: https://www.moma.org/collection/works/101473




[1] Art Since 1900: Modernism, Antimodernism, Postmodernism (Vol. 2), by Hal Foster, Rosalind Krauss, Yve-Alain Bois, Benjamin H. D. Buchloh, 2005


Alice Neel | Alice doesn’t live here anymore. First published in Alice Neel. Painted Truths, (cat.), Museum of Fine Arts Houston, 2010; and included in Marlene Dumas, Sweet Nothings. Notes and Texts | On Others, second edition (revised and expanded) Koenig Books London, 2014.